Autor : Paulo Dilkin; Prof. Mallmann (LAMIC - Laboratório de Análises Micotoxicológicas da Universidade Federal de Santa Maria.)
Introdução
Micotoxinas são substâncias tóxicas resultantes
do metabolismo secundário de diversas cepas de fungos filamentosos. Estes
se desenvolvem naturalmente em frutas, sementes, cereais e subprodutos que
são muito utilizados na alimentação humana e animal. Assim, mais
que quatrocentas toxinas são conhecidas. Uma vez ingeridas, causa diversos
efeitos deletérios a saúde, induzindo diferentes sinais clínicos e lesões.
Os tipos de sinais clínicos e lesões são intimamente relacionados a cada micotoxina, dose ingerida, período de intoxicação e espécie
animal envolvida. Objetivamos relatar neste trabalho, os sinais clínicos e
lesões causadas pelas principais micotoxinas, avaliadas recentemente no
sul do Brasil.
Material e métodos
Este trabalho é fundamentado na descrição de
sinais clínicos e lesões induzidas por micotoxinas em diferentes espécies
de animais intoxicadas em surtos naturais ou de intoxicação experimental
realizadas na última década pelo LAMIC. As atividades do laboratório consistem
no monitoramento micotoxicológico, analisando
aproximadamente 10.000 amostras/ano. Avaliação da qualidade de adsorventes
de micotoxinas in vivo e in vitro. Contudo, também
presta assistência técnica, solucionando surtos de intoxicação natural
caudas por micotoxinas em diferentes espécies. Com este trabalho, diversos
surtos de intoxicação foram acompanhados e identificados: aflatoxinas em
suínos, e aves, fumonisinas em eqüinos e suínos, zearalenona em suínos, ocratoxina em suínos, tricotecenos
em suínos e aves.
Resultados e discussão
A grande maioria das micotoxicoses
apresentam características essencialmente sub-clínicas,
cujas alterações dificilmente são percebidas na inspeção animal.
Esta tendência é confirmada na medida que
diversos alimentos contaminados com baixas concentrações de micotoxinas
são amplamente utilizadas na alimentação animal. Por esta razão, a quantidade
de surtos identificados de intoxicação crônica são significativamente maiores do que os casos de intoxicação aguda. Os sinais clínicos predominantes na micotoxicose
crônica são se relacionam à diminuição do desempenho produtivo dos
animais, incluindo redução da ingestão de alimentos, do ganho de peso,
conversão alimentar e produção de ovos por poedeiras, hipogalactia
em matrizes suínas, aumento da incidência de enfermidades no plantel,
falhas vacinais e diminuição da fertilidade. O aspecto clínico dos
animais geralmente é relacionados ao mau
desenvolvimento, como animais magros, pêlos secos e sem brilho, mucosas e
cristas pálidas, podendo ou não apresentar diferentes graus de diarréia e
lote de animais desuniformes. Contudo, algumas toxinas produzem sinais
clínicos característicos em diferentes espécies.
As aflatoxinas
Os sinais clínicos da aflatoxicose
aguda poderão iniciar 6 horas após a ingestão, traduzindo-se por severa depressão,
inapetência, presença de sangue nas fezes, tremores musculares, incoordenação motora com hipertermia
(até 41oC) que decresce após, podendo a
morte ocorrer nas 12-24 horas seguintes. Nas intoxicações subagudas, os
sinais clínicos são de evolução mais lenta, observando-se cerdas eriçadas,
hiporrexia, letargia e depressão. Paralelamente,
os animais podem apresentar aspecto ictérico, encontram-se desidratados e
emaciados, com áreas de coloração vermelho púrpura na pele, além de perda
progressiva de peso. A intoxicação crônica manifesta-se pela diminuição no
ganho de peso e redução da conversão alimentar, inapetência, má aparência
geral e, por vezes, diarréias. Com a progressão para os estágios finais,
ocorrem freqüentemente sinais de ataxia,
icterícia e, às vezes, convulsões. Em surtos de aflatoxicose
no campo, uma das características mais marcantes é a má absorção que se
manifesta como partículas de ração mal digeridas nas excretas das aves.
Está associada com esteatorréia ou
excreção aumentada de lipídeos. Em frangos de corte, a esteatorréia
é acompanhada por uma diminuição nas atividades específicas e totais da lipase pancreática, principal enzima digestiva das
gorduras, e pela diminuição dos sais biliares, necessários tanto para a
digestão como para a absorção de gorduras, levando a esteatose
hepática (fígado gorduroso). Também se observa, em frangos e poedeiras
que recebem ração contaminada com AF, extrema palidez das mucosas e
pernas. Esta pigmentação deficiente parece ser resultado da menor absorção,
diminuição no transporte e deposição tecidual dos carotenóides da dieta
sendo a aflatoxicose identificada como "síndrome
da ave pálida".
Além de reduzir a produção de ovos, a aflatoxicose também é responsável pela redução
do tamanho dos ovos, bem como pela redução proporcional no tamanho das
gemas, devido aos prejuízos causados na síntese protéica e lipídica. Mas a
deposição de cálcio na casca dos ovos por si só não é afetada, podendo
inclusive aumenta-la e dificultar a eclosão. A
postura é afetada somente 14 dias após o início da intoxicação, enquanto a
eclodibilidade começa a ser
afetada imediatamente após o início do consumo de ração contaminada.
Quando a toxina é ingerida em níveis mais
elevados, o fígado apresenta degeneração gordurosa, necrose lobular com
incremento de células basofílicas na periferia do
lóbulo, proliferação dos ductos biliares e cirrose. A icterícia da
carcaça, associada ao fígado edemaciado e amarelado são indicativos muito
fortes de intoxicação. A vesícula biliar pode estar edemaciada e o fígado
friável e hiperêmico, principalmente nos casos de
intoxicação aguda. Também ocorre uma diminuição do tempo de coagulação
sangüínea, podendo observar-se coleções líquidas sanguinolentas nas
cavidades bem como em mucosas e hemorragias em massas musculares.
Em eqüinos, as fumonisinas possuem tropismo especial pelo sistema nervoso
central, onde produzem uma necrose liquefativa da substância branca, cuja lesão é
denominada leucoencefalomalácia Assim, eqüinos
intoxicados por fumonisinas apresentam distúrbios
nervosos. Os sinais clínicos caracterizam-se por inapetência, fraqueza
generalizada, sonolência, anorexia, lentidão ao caminhar, depressão,
sinais de cegueira, desorientação seguida por ataxia,
tendência de permanecer com os membros anteriores cruzados, andar em
círculo, batidas contra cercas e objetos, decúbito lateral e movimentos de
pedalar até a morte. As alterações anatomopatológicas mais observadas
estão relacionadas a assimetria dos hemisférios
cerebrais, achatamento das circunvoluções. Ao corte transversal do
encéfalo, visualiza-se as áreas focais de
hemorragias, distribuídas aleatoriamente pela substância branca subcortical. A formação de áreas cavitárias maiores
que
A zearalenona possui
destacados efeitos estrogênicos
A ocratoxina A
afeta principalmente os rins. Causa alteração da filtração glomerular
e prejuízos na função dos túbulos contornados proximais são os principais
prejuízos da intoxicação por ocratoxina A,
levando a perda da capacidade de concentração urinária. A ocratoxicose
em suínos traduz-se por uma intoxicação que cursa com diminuição do ganho
de peso, sinais clínicoscaracterizados por polidipsia e poliúria, além de lesões renais que podem
levar a hematúria. Dosesde
200 mg/kg de OTA na ração
foram suficientes para que os animais apresentassem nefropatias, levando
a reflexos negativos sobre a conversão alimentar e o ganho de peso. A
mortalidade pode chegar a 90% nos lotes afetados.
Tricotecenos
compreendem cerca de uma centena de micotoxinas. Nivalenol
e Deoxinivalenol induzem recusa de alimentos e
perda de peso. Nível combinado menor que 0,4 mg/kg é descrito como aceitável (para suínos, os
quais são relativamente susceptíveis), enquanto mais de 2,0 mg/kg é sempre inaceitável. Os tricotecenos
estão relacionados à recusa alimentar e distúrbios gástricos
A ingestão de Alcalóides de ergotamina
por suínos levam ao aumento da ingestão de água, e poliúria. A toxina
apresenta ações ocitócicas e vasoconstritivas,
clinicamente observadas pela isquemia das extremidades, como orelhas,
focinho, pernas e cauda. Em surtos graves ocorre a gangrena, levando
freqüentemente a perda de órgãos por processos degenerativos e necróticos.
A freqüência cardíaca decresce e a pressão arterial aumenta à medida que
aumenta a quantidade de alcalóides ingeridos.
Ergotismo gangrenoso tem sido diagnosticado em
lactantes de porcas intoxicadas, embora a hipogalactia
ou agalactia seja sempre o primeiro sinal clínico da
intoxicação, que pode ser produzida com uma dose única de ergocriptina administrada oralmente 24 horas do parto. Acreditase que o efeito primário seja pela inibição da
prolactina. A redução do tamanho do mamilo das
tetas ocorre concomitantemente à diminuição da produção de leite.
Conclusões
As micotoxicoses
representam um importante fator clínico nas espécies domésticas. O devido
reconhecimento dos sinais clínicos é impressindível
para minimizar as perdas econômicas decorrentes, bem como a adoção de
medidas profiláticas adequadas.