Informativo Técnico Nº. 123

Em busca da integridade intestinal de leitões desmamados

Autor : Julian Cristina Borosky (Selko)

Atualmente, os custos envolvidos na produção de suínos são muito elevados em detrimento de sua remuneração. Nesse sentido, empresários e profissionais do ramo têm buscado intensificar a produtividade dos rebanhos em busca de maiores retornos econômicos.
Um dos principais parâmetros que determina a excelência produtiva de uma UPL (Unidade Produtora de Leitões) é a taxa de desmamados/ porca/ ano. Com o intuito de se aumentar esse índice têm-se buscado reduzir de forma eficiente o número de dias não produtivos das porcas e simultâneamente tem-se reduzido o período de aleitamento.
Lima e colaboradores (2009) apontam que a idade de desmame utilizada comercialmente tem sido reduzida drasticamente nas últimas quatro décadas, passando de 56 dias para os atuais 21 a 28 dias de vida. Considerando-se que o desmame natural dos suínos ocorre entre 70 a 84 dias de idade (Zintzen, 1975; English et al, 1977; Webster, 1981; Harris, 1990) fica nítido o despreparo do leitão para seguir seu desenvolvimento longe da porca.
Inúmeros trabalhos têm apontado o desmame como o evento mais crítico da vida do leitão, onde um animal que ainda não tem uma maturidade fisiológica, anatômica e imunológicas consolidadas (Silva, 2009), é submetido a vários fatores estressantes de ordem nutricional, social, ambientais e de manejo (Morés e Amaral, S.A.).
Não é de se estranhar que as patologias pós desmame, em especial aquelas de ordem gastrointestinal sejam exaustivamente estudadas, pois sabe-se que devido a esses fatores intrínsecos e extrínsecos ao animal haverá uma desregulação da flora microbiana do trato gastro intestinal, (figuras 1 e 2), e consequente surgimento de diarréias.

Fig 001

Figura 1:. Relação Lactobacilus x E. coli (log UFC/ g de mucosa) pré e pós desmame (idade ao desmame, 26 dias) Adaptado de Mulder et al (1993)

Fig 002

Figura 2:. Relação Lactobacilus x E. coli (%) pré e pós desmame (idade ao desmame, 26 dias) Adaptado de Mulder et al (1993)

Durante décadas antibióticos foram utilizados na alimentação desses animais, em doses subterapeuticas, com o intuito de se controlar o crescimento desordenado de bactérias patogênicas e consequentemente controlar diarréias nessa fase.
Todavia, com os banimentos de APC´s (antibióticos promotores de crescimento) pela União Europa, na última década, e recentes restrições pelas Autoridades Brasileiras para o uso dos mesmos em dietas animais, esse conceito precisou ser revisto e ficou evidente a necessidade de se adotar medidas específicas de nutrição, manejo, ambiência e sanidade que atendam as necessidades dos animais nessa fase e que visam reduzir os fatores estressantes aos quais eles são submetidos.
Dentro desse contexto, intensas pesquisas têm sido realizadas com o objetivo de se encontrar aditivos alternativos que possam atuar como promotores de crescimento e estabilizadores de flora intestinal.
Resumidamente, os estresses de ordem nutricional podem ser reduzidos através de uma formulação adequada a fase e um manejo específico pré-desmame.
As dietas pré-iniciais devem ser formuladas com ingredientes de alta digestibilidade, livres de fatores antinutricionais e alergênicos e com baixa capacidade tamponante, a fim de se obter uma dieta final que atenda as necessidades nutricionais do leitão e tenha uma capacidade tampão (CT) final em torno de 200 a 350 meq/kg. Isso é essencial para a adequada acidificação estomacal.
Em relação ao manejo nutricional, a ração deve ser apresentada em poucas quantidades e várias vezes ao dia para os leitões ainda na fase de aleitamento, para que os mesmos se condicionem a comê-la e que se inicie a adaptação morfo-fisiológica do trato gastro-intestinal ainda no pré-desmame.

Outro fator intrínseco ao consumo de ração e menos abordado é o consumo de água. Os leitões devem ser apresentados a uma fonte de água de qualidade e fresca ainda na fase de aleitamento, para que fiquem condicionados a consumir água. Estudos mostram que a relação de consumo de água x consumo de ração é de 2,5 a 3,0 vezes (tabela 1), portanto deve haver uma chupeta para os leitões reguladas quanto a altura e vazão para que os animais possam consumir água de forma adequada.

Tabela 1:. Requerimento de água e vazão dos bebedouros para leitões.

Tabela 01

Essas medidas reduzirão o estresse nutricional pós desmame, pois os animais submetidos a esse manejo retomarão o consumo de ração nos primeiros 7 dias pós desmame mais rápido que animais que não receberam tal tratamento, reduzindo assim as perdas zootécnicas comumente observadas nesse período.

Outro fator importante, referente a imaturidade fisiológica do leitão refere-se a baixa acidificação estomacal.
Estudos mostram que leitões lactentes têm pH estomacal mais elevado que suínos em fase de crescimento e terminação entre outros fatores, por terem deficiente produção de ácido clorídrico. No entanto, a degradação da lactose por Lactobacillus sp. produz ácido láctico o que auxilia a acidificação estomacal, atuando tanto na degradação da caseína, na ativação da pepsina e melhor digestibilidade do leite, como eliminando do meio possíveis microorganismos patogênicos.
Dessa forma, presume-se que a insuficiência digestiva e desordens intestinais de leitões desmamados podem estar parcialmente relacionadas às condições de acidificação estomacal inadequada, resultando em baixa ativação da pepsina e proliferação de microorganismos patogênicos (Rostagno; Pupa, 1998).
Diversos autores pesquisaram o uso de ácidos orgânicos na dietas de leitões mostrando o efeito benéfico desses produtos, tanto na acidificação estomacal (figura 3) quanto na melhoria da digestibilidade da dieta ao nível de duodeno. Costa (2011) apontam que os ácidos orgânicos estimulam a secreção endócrina e exócrina do pâncreas, aumentando tanto a produção de enzimas pancreáticas como a produção de bicarbonato de sódio.

Fig 003

Figura 3: Avaliação do pH estomacal de leitões desmamados com dietas sem inclusão de ácidos orgânicos (AO) e com inclusão de ácidos orgânicos (AO) Selko BV (S.A.)

Outros estudos, porém, sugerem que os efeitos benéficos dos ácidos orgânicos nesse contexto, variam segundo o tipo de ácido utilizado (fórmico, acético, butírico ...) e também pelas propriedades químicas da dieta, pois sabe-se que minerais e outros ingredientes tamponantes neutralizam o ácido presente na ração.
Portanto, o uso de blends de ácidos orgânicos na água de bebida dos animais se torna uma excelente ferramenta para atingir adequada acidificação estomacal e melhorar a digestibilidade da dieta, pois reune o efeito benéfico de diferentes ácidos orgânicos e, por ser via água de bebida, não interage negativamente com as propriedades químicas da ração.
Outro benefício do uso de ácidos orgânicos via água de bebida é a certeza do tratamento de todo lote, pois sabe-se que animais doentes ou em período de encubação do agente patogênico reduzem o consumo de ração, porém mantém o consumo de água.
Infelizmente o desmame ocorre em uma idade em que o animal está perdendo a imunidade passiva e está desenvolvendo a imunidade ativa, portanto seu status imunológico é deficitário, seja por imunoglobulinas séricas (figura 4) ou seja por imunoglobulinas de mucosa. Estudos apontam que a principal fonte de IgA para leitões é o leite da porca, portanto, após o desmame não há IgA disponível para proteção de enterócitos.

Fig 004

Figura 4:. Nível de imunidade em relação à idade ao desmame Adaptado de Ristow (2005.)

Dessa forma os leitões desmamados estão susceptíveis a infecções e portanto é evidente a necessidade de adoção de medidas sanitárias adequadas, como manejo de todos dentro todos fora e adotar um procedimento de limpeza, desinfecção e vazio sanitários eficazes, a fim de se reduzir a pressão de infecção ambiental e no animal.
A manutenção do equilíbrio da flora intestinal nesse período é imprescindível. Embora durante anos utilizou-se antibiótico em doses subterapeuticas com esse fim, sabe-se que essas drogas não são específicas, atuando tanto em microorganismos patogênicos como aqueles ditos benéficos (ex. Lactobacillus), piorando o quadro de disbacteriose pós desmame, o que ocasionava o uso ininterrupto dessas drogas.
Atualmente existem vários aditivos alternativos disponíveis com o intuito de preservar e manter o equilíbrio da flora intestinal.
Entre eles, os ácidos orgânicos têm se destacado por apresentarem diferentes formas de ação no trato gastro intestinal.
Inúmeros trabalhos têm apontado que o uso de ácidos orgânicos como o cítrico, fórmico, propiônico, láctico, em dietas de leitões desmamados têm ajudado a contornar problemas de baixo desempenho que caracterizam a fase imediatamente após o desmame (Giesting, Roos, Easter, 1991; Radcliffe, Zhang, Kornegay, 1998).
Segundo Mroz (2002) os ácidos graxos de cadeia curta (SCFA) desempenham um papel muito importante na regulação da ecologia luminal do trato gastro-intestinal de não ruminantes, pois são produzidos durante o processo de digestão.
Os sais de amônia de SCFA apresentam excelente resultado para controle bactérias gram negativas em duodeno. Os ácidos graxos de cadeia média (MCFA), por sua vez, têm demonstrado ação contra bactérias gram negativas e gram positivas em todo TGI até ceco. O uso de MCFA, juntamente com enzimas lipolíticas, promove um ambiente fisiológico em estômago que regula e estabiliza a microbiota gastrointestinal (Dallagnol, 2009).
O ácido butírico protegido ou na forma de sais de sódio (buritato de sódio) tem apresentado resultados importantes na manutenção de integridade intestinal, por agir na junção celular.
Novamente, embora os estudos salientem os benefícios dos ácidos orgânicos na estabilização de flora intestinal esses benefícios dependem do tipo de ácido, forma de apresentação e de possíveis interações aos ingredientes da dieta.
Mais uma vez os blends de ácidos orgânicos e seus sais de amônia se mostram como excelente ferramenta para melhoria de desempenho e estabilidade de flora intestinal, uma vez que agregam os efeitos benéficos dos diferentes ácidos que o compõem e têm o benefício dos sais de amônia que garantem a ação em bactérias patogênicas no trato gastro-intestinal.
Como pôde ser notado, em busca de melhores resultados econômicos temos submetidos animais imaturos a condições ambientais desfavoráveis. Cabe a nós, empresários e profissionais do ramo adequar a nutrição, ambiente, manejo às condições anatomo-fisiológicas e imunitária desses animais, bem como adotarmos em nossa rotina uso de aditivos promotores de estabilidade da flora intestinal, a fim de se garantir o melhor desempenho do mesmo durante toda sua vida produtiva.

 


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