Autor : Prof. Dr. Homero Fonseca.
Geograficamente os trópicos incluem a
parte do globo entre as latitudes de aproximadamente 23o norte e 23o
sul. Nem todas as áreas aí compreendidas são quentes e úmidas mas, na maioria
delas, as condições atmosféricas são muito favoráveis (de
Os fungos, bolores ou mofos podem, pela sua ação direta, ocasionar vários
problemas aos produtos armazenados. Desenvolvendo-se sobre sementes podem
causar perda do seu poder germinativo; podem afetar a qualidade por
descoloração do arroz e da manteiga de cacau, produzir aromas desagradáveis,
como no caso do café, e alterando as condições físicas por desidratação dos
produtos onde crescem. Podem também diminuir o valor nutritivo das proteínas,
na maioria dos produtos, dos óleos e gorduras, por hidrólise das mesmas, no
amendoim, soja etc., além de prejudicar seriamente o aspecto externo dos
alimentos. Podem produzir toxinas como no amendoim, arroz e muitos outros
produtos, além de abrir caminho para outros agentes de deterioração como as
leveduras e bactérias bem como aos insetos.
Alguns dos levantamentos mais antigos, no que diz respeito à depreciação do
valor ocasionado pelo ataque de fungos, foram efetuados pelo Tropical Products Institute na década dos
30. Mais recentemente, o Central Food Research, na Índia, estudou extensivamente o efeito de
fungos no armazenamento do café. Foi constatado que a produção microbiana
crescia marcadamente quando o café absorvia umidade. Esta microbiota
consistia principalmente de Cunninghamella, Trichoderma, Aspergillus e Penicillium. No café cereja apareceu uma população
diferente de fungos, com predominância de tipos filamentosos. Os cientistas não
conseguiram constatar mudanças na constituição química dos grãos, mas a cor e a
qualidade da bebida foram prejudicadas pelo ataque dos fungos.
No Brasil também foram feitos alguns estudos em cafés cujas bebidas eram de
má qualidade as quais foram atribuídas a diversos fungos, incluindo espécies de
Clodosporium, Penicillium e
Fusarium.
Muitos estudos foram feitos também com o cacau. Mais de 50 tipos de fungos
foram identificados nas várias etapas do processo de obtenção deste fruto e os
mais importantes são espécies de Aspergillus, Penicillium e Mucorales. Os
fungos que atacam o cacau podem ser classificados em 2 grupos: os que parecem
ser inócuos ao consumidor e crescem principalmente sobre a testa da amêndoa e
os que penetram profundamente na amêndoa e estão associados com odores
desagradáveis. Nesta segunda classe estão incluídos o Aspergillus
fumigatus e o A. glaucus.
Os principais problemas, quando os produtos alimentícios estão
convenientemente secos, são causados por insetos e roedores. Em muitos países
estes depredadores são combatidos até com bastante eficiência. Porém, os fungos
não são considerados de muita importância, principalmente na Africa. Aliás, diga-se de passagem, muitas tribos africanas
preferem alimentos que foram atacados por fungos. Eles gostam, por exemplo, de
mandioca recoberta por um fungo preto, provavelmente Aspergillus
niger.
As sementes oleaginosas tropicais, quando impropriamente armazenadas, também
deterioram rapidamente com aumento de acidez que, freqüentemente, corresponde a
uma alta proporção de amêndoas quebradas. Estudos efetuados com dendê mostraram
que amêndoas inteira armazenadas por 12 semanas tinham 3% de acidez livre ao
passo que as quebradas tinham três vezes mais. Estes mesmos revelaram que os
fungos presentes consistiam quase que somente de espécies de Aspergillus das quais a mais comum era a do A. flavus, que tem uma marcada ação lipolítica nas gorduras.
Estudos com outras oleaginosas revelaram resultados semelhantes. O Quadro 1,
anexo nos dá uma idéia dos fungos que mais comumente ocorrem nas oleaginosas
armazenadas e sua atividade lipolítica.
O aumento da acidez livre nas oleaginosas ocasiona um duplo prejuízo:
primeiro um decréscimo no teor de óleo e segundo, por exigir um maior gasto de
lixívia sódica, necessária para neutralizar a acidez livre. Além disso, o sabão
formado na neutralização da acidez arrasta consigo, uma certa percentagem de
óleo, que será tanto maior quanto for a acidez.
Além do problema das perdas econômicas pelo aumento da acidez, o
desenvolvimento de fungos é geralmente acompanhado de produção de toxinas
bastante deletérias como é o caso da aflatoxina do A.
flavus, da ocratoxina do A.
ochraceus (A. allutaceus) e
outras.
Sabe-se hoje que o A. flavus basicamente, pode se
desenvolver no amendoim antes da colheita, por danificação da casca por insetos
ou instrumentos agrícolas e, também, por penetração pelo ginóforo. Durante a
secagem, seja no campo, seja em terreiros, é mais provável o desenvolvimento da
aflatoxina, porém em níveis não muito elevados (a não
ser que chova muito na colheita). Todavia, as altas concentrações da toxina são
encontradas em amendoim colhido (com as colhedoras) ainda úmido e
impropriamente armazenado, ou por conter demasiada umidade ou por falta de
proteção ao reumedecimento durante o armazenamento.
Estudos feitos neste sentido mostraram que é durante o transporte e armazenamento
que concentrações elevadas da toxina são encontradas, causadas por secagem
insuficiente antes do armazenamento, por infiltração de água em caminhões ou
armazéns ou mesmo por reumedecimento deliberado.
Em nosso país, o lavrador e o industrial, com exceções, ainda ignoram os
problemas causados pelo ataque de fungos, quer do ponto de vista das perdas já
citadas, quer do ponto de vista da aflatoxina, embora
este também reflita no plano econômico. A aflatoxina
continua causando entraves e inclusive desentendimentos entre exportadores
brasileiros de amendoim e sub-produtos e os importadores europeus dessas
matérias primas.
Quadro 1. Ação
lipolítica de fungos que incidem em sementes oleaginosas armazenadas.
ESPÉCIE |
ATIVIDADE LIPOLÍTICA |
Aspergillus
flavus |
++ |
A. fumigatus |
++ |
A. niger |
++ |
A. awamori |
++ |
A. chevalieri |
+ |
A. nidulans |
+ |
A. sulphureus |
+ |
A. tamarii |
+ |
A. ustus |
+ |
Syncephalastrum
racemosum |
++ |
Paecilomyces
varioti |
+ |
Penicillium
steckii |
+ |