Autor : Nelson Morés
(Pesquisador da Embrapa Suinos e Aves.)
1 – INTRODUÇÃO
A taxa de mortalidade de porcas (MP) em um rebanho é um dos determinantes
mais importantes do resultado financeiro de uma unidade de produção de suínos.
Em estudo realizado nos Estados Unidos num rebanho de 500 matrizes, cerca de
40% das porcas mortas sofreram eutanásia porque não tinham possibilidade de
recuperação e por questões de bem estar animal. A maioria dos
trabalhos consideram corretamente a eutanásia no cálculo da taxa de MP,
pois nesse caso não há aproveitamento econômico da carcaça. Então, nesse
artigo, a taxa de MP, refere-se a mortes e/ou eutanásia de porcas. Existem
várias formas de cálculo das taxas de MP nos rebanhos, porém, a que melhor
representa a situação do rebanho é a taxa de MP anual, em função do inventário
médio de matrizes no ano. Mesmo assim, quando os métodos de inventário anual de
matrizes ou os programas de gerenciamento de dados são diferentes entre
rebanhos, a comparação das taxas anuais de MP entre rebanhos devem ser
interpretadas com certa cautela.
Quanto deve ser a taxa anual de MP nos rebanhos? Os alvos citados são de
5-8% e o nível de interferência >10% (ALMOND et al., 2006). Segundo Deen,
(2000) as taxas reais de MP das granjas, geralmente excedem aquelas
historicamente informadas na literatura.
A MP é um problema multifatorial associado a vários componentes do sistema
produtivo: genética, cuidados dos trabalhadores, nutrição, manejo, bem estar,
ambiente e infecção. As causas específicas são pobremente entendidas porque o
exame "post-mortém" detalhado e exames
complementares raramente são realizados. O aumento da taxa de MP pode ser
interpretado como um indicativo indireto do alojamento de porcas geneticamente
melhoradas nos modernos sistemas de produção (HENRY et al., 2000).
1.1 – Importância
econômica
A viabilidade das porcas nos rebanhos é um dos indicadores econômicos mais
importantes para o setor de suínos. A alta taxa de MP, além do impacto
econômico direto, afeta a prolificidade geral do
rebanho e a moral das pessoas ligadas à atividade. Exceto para episódios
agudos, a MP um pouco acima do alvo é, freqüentemente,
ignorada pelos gerentes, proprietários de granjas e pela indústria de suínos.
Todavia, isso deve soar como um alarme para o gerente de produção.
Nas últimas décadas houve um aumento importante na taxa de MP (Tabela 1).
Dados de campo relativos ao ano de1995 apresentaram as seguintes taxas anuais
de MP: 5,45% ± 2,80 no Brasil; 6,49 ± 3,30 no Canadá; 7,80 ± 4,80 nos Estados
Unidos (PALOMO, 2006). Em 1996 na França, num estudo envolvendo 102 rebanhos, a
taxa anual média de MP, foi de 6,4%, porém com ampla variabilidade entre
rebanhos (Tabela 2) (ABIVEN et
al., 1998). Koketsu, (2000) avaliou dados de cinco
anos (
Tabela 1. Evolução cronológica de alguns parâmetros ligados
aos sistemas produtivos de suínos.
Tabela 2. Taxa de mortalidade anual de porcas anual em
rebanhos com alta (>5%) e baixa (£ 5%) taxas de mortalidade na França em
1995.
Produtores brasileiros que possuem sistema informatizado de gerenciamento da
granja, gentilmente informaram as taxas anuais de MP nos últimos 3 anos (Tabela
3). Observa-se uma variação nas taxas entre 1,39% a 11,80% entre as diferentes
granjas.
Considero que taxas de MP acima de 5% são altas, embora Almond
et al. (2006) citem 5-8%
como taxas alvos e o nível de interferência >10%. As perdas financeiras
decorrentes da MP incluem o valor da porca morta e dos leitões perdidos quando
gestante, o custo de oportunidade dos leitões que seriam produzidos quando a
porca está gestante, o custo de uma reposição precoce e a queda na qualidade do
rebanho que é difícil de ser estimado. Ademais, a morte de uma porca, muitas
vezes envolve a retenção de uma matriz que normalmente deveria ser descartada.
Como a MP, também, afeta a moral dos funcionários e gerentes, isso pode ter
reflexos negativos sobre o manejo
geral da granja. As perdas econômicas diretas devido a MP em um rebanho foram
estimadas em
1.2 – Causas
As MP podem ser (SANZ et
al., 2007): súbitas (porcas aparentemente normais e que morrem), esperadas
(porcas que são tratadas sem resposta e morrem) ou por eutanásia (porcas que
são propositadamente sacrificadas devido ao prognóstico desfavorável e por
questões de bem estar). As causas de MP nos rebanhos são numerosas e variáveis,
muitas delas devido a distúrbios gastrintestinais, infecção do trato urinário,
distúrbios cardiovasculares, problemas do parto
e distúrbios no puerpério, enquanto a eutanásia é
mais freqüente nos problemas locomotores (fraturas, artrites, epifisiólise, apofisiólise, abcessos, osteocondrose etc.).
Palomo, (2006) cita as seguintes causas envolvidas
na MP: morte súbita (17,5%), problemas locomotores (15,7%), infecção urinária
(9,6%), parto distóxico (8,8%) e úlcera gástrica,
representando 58% do total; porém, em 33,2% das porcas mortas, as causas não
foram identificadas (Tabela 4). Nos anos de 1998 e 1999, em oito sistemas de
produção com MP anual ³12%, localizados em 6 diferentes áreas geográficas nos
Estados Unidos, os problemas locomotores, estruturais e sépticos, foram os
problemas mais freqüentemente encontrados (Tabela 5) (IRWIN et al., 2000).
Tabela 3. Inventário de matrizes e mortalidade de porcas em
alguns rebanhos brasileiros nos anos de
Em outro estudo sobre 107 porcas mortas de um rebanho de 5.200 porcas, os
principais problemas encontrados estavam associados aos sistemas locomotor
(artrite e osteocondrose/discondroplasia),
gastrintestinal (úlcera, peritonite, prolapso retal,
torção), reprodutivo (distoxia, prolapso
uterino) e urinário (cistite/pielonefrite); porém
menos freqüente, algumas mortes estavam associadas ao aparelho respiratório
(pneumonia purulenta, pleurite, broncopneumonia) e circulatório (pericardite,
necrose do miocárdio e insuficiência cardíaca congestiva) (SANZ et al., 2007). Entretanto, como a
cistite/pielonefrite estão
associadas ao aumento na duração do parto e com complicações pósparto, não foi surpreendente que 50% dos achados de
necropsia tenham apresentado cistite/pielonefrite
como lesão secundária, quando as complicações do parto foram consideradas como
causa primária das mortes.
Tabela 4. Causas e estágio do ciclo reprodutivo de
mortalidade de porcas.
Tabela 5. Causas de morte ou eutanásia de porcas em oito rebanhos norte americanos com taxa anual de MP ³12%,
nos anos de 1988 e 1999.
Quanto ao ciclo produtivo, Palomo (2006) encontrou
62,25% de mortes em porcas no 1º (35,2%) e 2º (27,2%) ciclos (Tabela 3) e Sanz et al. (2007) observaram que 60%
delas tinham 3 partos ou menos, e que as perdas de porca foram mais freqüentes
durante a gestação (40,65%) e lactação (39,4%) do que na cobrição
(20,0%). Schultz et al.
(2001), verificaram que 39% da mortalidade de porcas ocorriam nos sete dias peri-parto (2 dias antes e 5 depois do parto), incluindo
problemas como retenção de placenta e/ou leitões, injúrias físicas, infecção,
resposta imunológica prejudicada e inadequado consumo de ração logo após o
parto.
Um súbito aumento da mortalidade de porcas em um rebanho pode ser provocado
por infecções específicas. A PRRS pode provocar importante aumento das perdas
de porcas em um rebanho (IRWIN, et
al., 2000), mas segundo Henry et al. (2000) os dados
são controvertidos e, no presente, há pouca informação para sugerir que essa
doença tem efeito na mortalidade de porcas. No Brasil, essa doença ainda não
tem sido notificada.
Porcas criadas em Siscal possuem maior taxa de
mortalidade do que as criadas em confinamento (AKOS & BILKEY, 2006). Em um Siscal na Europa foi diagnosticado um súbito aumento de
mortalidade de porcas no período pós-parto, associado ao estresse ambiental e
tendo como causa o Clostridium difficile
(KISS & BILKEI, 2005). Nessa região da Europa a mortalidade de porcas é
maior no Siscal do que no sistema confinado. O
problema clínico apareceu como uma síndrome MMA pós parto, onde 13% delas morreram, mesmo medicadas. A mortalidade anual que era de
2,4% antes do episódio, passou a 6,2% no período seguinte. Na necropsia
apareceu edema do mesocolon, hidrotorax
e ascite. A interrupção da administração de enrofloxacina
para controle dos problemas pós parto reduziu a
mortalidade de porcas de 6,2% para 2,6%, sugerindo que esse antibiótico era
parte do problema. No Kenia, em outro sistema de
criação ao ar livre, essa condição foi associada a
erisipela e infeção por Clostridium
novyi, tendo como fonte de infecção o ambiente. Na
infecção por C. novyi verificaram descoloração
púrpura da pele, rápida distensão da carcaça, edema mandibular, superfície do
fígado escuro com aparecia cor bronze e com formação de bolhas de gás,
congestão pulmonar, hemorragia e exsudado serosanguinolento
em todas as cavidades e estômago com timpanismo e
repleto de alimento. Já na erisipela observaram morte súbita, febre, andar com
dificuldade demonstrando dor, letargia, inapetência, lesões de pele e aborto
(FRIENDSHIP & BILKEI, 2006).
2 – FATORES DE RISCO
Como as causas da MP são variadas e complexas, o conhecimento dos fatores de
risco envolvidos é fundamental para estabelecer programas de controle. O
aumento da taxa de MP pode ter relação com o aumento no tamanho dos rebanhos,
redução do período de lactação e, em alguns casos, com prevalência alta de
algumas enfermidades crônicas. Há um efeito sazonal para a MP, com maior
freqüência no verão, especialmente quando a temperatura da sala é igual ou
superior a
Então, o parto e a temperatura elevada da sala, parece
que em muitos rebanhos são os fatores de risco mais importantes. Ademais, Deen et
al. (2000) encontraram também efeito significativo (P<0,0005) para as variáveis
ligadas individualmente à porca:
Em um estudo tipo caso-controle realizado na
Bretanha-França em 102 rebanhos (ABIVEN et
al., 1998) foram identificaram os seguintes fatores de risco associados a MP:
Por outro lado, Geiger et al. (2000) encontraram outros
fatores envolvidos na viabilidade de porcas:
Os fatores de risco acima citados devem ser
interpretados como indicadores da qualidade do manejo e higiene. Geralmente, a
alta taxa de MP em um rebanho reflete pobre condição global de criação dos
animais.
2.1 – Controle
Medidas de intervenção que definem necessidades fisiológicas, direcionadas
ao manejo da alimentação e do ambiente parecem ser os melhores passos iniciais
no controle das perdas de porcas. Quando as causas envolvidas não são
específicas, o controle envolve uma análise aprofundada dos possíveis fatores
de risco existentes na granja que podem estar contribuindo para o aumento da
mortalidade.
Atenção especial deve ser dada ao plano de alimentação das porcas
mantendo-as sempre em bom estado nutricional, aos períodos de maior risco como
no pari-parto, a temperatura da sala quando excede
O gerente e os funcionários devem estar aptos para identificar precocemente
porcas com problemas e que necessitam de cuidados especiais como remoção para
local adequado (baia hospital) e tratamento individualizado, sob orientação
veterinária.
Embora existam informações de que o uso de antibióticos pode reduzir a
mortalidade de porcas, isso não é aceitável como um bom procedimento
operacional e não deve substituir a atenção que deve ser dispensada às
necessidades fisiológicas das porcas.
3 – CONCLUSÕES
De maneira geral dá-se muito mais atenção para taxas de mortalidade acima do
normal nas fases de creche e crescimento/terminação do que para as taxas de MP.
Por que as vezes ignoramos as taxas de MP acima de 5%
ao ano nos rebanhos? O impacto dessa variável na produtividade geral do rebanho
é alto e não deve ser negligenciado.
Pelos dados de literatura e da experiência na análise global de rebanhos
brasileiros, as taxa de MP são elevadas em muitas granjas. Os técnicos e
produtores não podem se conformar com MP anual acima de 5% em um rebanho suíno,
pois isso, além do impacto econômico direto, reflete a existência de problemas
globais e afeta a produtividade geral do rebanho.
A saúde do rebanho e à atenção dada ao manejo das matrizes
são componentes críticos para a MP. Cuidadosa observação diária das
porcas, deslocamento adequado entre os galpões, inspeção diária da
disponibilidade de água, adequado plano de alimentação das porcas
e rápida intervenção individual com isolamento daquelas com problemas de
saúde são essenciais para manter a taxa de MP abaixo de 5%.