Autor : Andrea Panzardi, Brenda
Maria Ferreira Passos Prado Marques, Giseli Heim, Fernando Pandolfo Bortolozzo; Ivo Wentz.
INTRODUÇÃO.
O peso do leitão ao nascimento (PN) é considerado um dos principais fatores
diretamente relacionados à sua sobrevivência [67], bem como com seu peso ao
desmame e desempenho posterior, até o momento do abate.
Apesar do grande progresso genético e no manejo
ao longo dos anos, a mortalidade pré-desmame de leitões ainda representa um
grande entrave econômico na suinocultura moderna [45]. Isto se torna uma
realidade quando deparamos com taxas de mortalidade pré-desmame que permanecem
relativamente constantes desde meados das décadas de 50 [39], 60 [16], 90 [43]
e até hoje em dia [67], girando em torno de 25%, 15%, 20%, 16%,
respectivamente, na grande maioria dos plantéis.
Atualmente, as linhagens de fêmeas suínas destinadas à reprodução vêm sendo
melhoradas geneticamente, no intuito de tornarem-se hiperprolíficas.
Além disso, mudanças inerentes ao manejo possibilitaram o aumento do número de leitões desmamados/fêmea/ano, passando de uma média de
Em virtude dos programas de melhoramento genético das
empresas serem, primeiramente, focados em características produtivas e
reprodutivas, como tamanho da leitegada e ganho de peso diário (GPD) [49],
características como capacidade uterina, eficiência placentária e nutrição
acabam não sendo focadas na mesma proporção, porém, são de extrema importância
para uma perfeita harmonia do processo do desenvolvimento embrionário e fetal
como um todo, levando a um bom peso do leitão ao nascer.
IMPORTÂNCIA DO PESO AO NASCER NA SOBREVIVÊNCIA NENONATAL E
DESENVOLVIMENTO ATÉ O ABATE
Com os recentes avanços genéticos, hoje é possível atingir um patamar de GPD
de leitões em torno de
Um menor PN predispõe a uma menor chance de sobrevivência [67,82], sendo
este efeito verificado em leitões com média de PN inferior a
Outro fator interessante a ser destacado e associado ao baixo PN é a perda
de peso nas primeiras 24 horas de vida, a qual também pode contribuir com a
taxa de mortalidade durante o período neonatal [6] (Tabela 1).
Tabela 1.
Indicadores de sobrevivência pós-natal (médias e erros padrão) comparando
leitões sobreviventes (n=113) e os que morreram (n=13) no período neonatal.
Além disso, a capacidade termorregulatória dos
leitões possui grande impacto em sua viabilidade, sendo este parâmetro
fisiológico diretamente relacionado ao PN. Leitões mais leves possuem maior
superfície corporal em relação ao seu peso, sendo, portanto, mais propensos a
um quadro de hipotermia [38]. Panzardi et al. [61] demonstraram que o PN
(<1,275kg), a temperatura corporal às 24h pós-nascimento (<38ºC) e a
ordem de nascimento (>9) são os melhores indicadores da taxa de
sobrevivência durante a primeira semana pós-natal.
Segundo Rehfeldt & Kuhn [71], leitões com
baixo, médio e elevado PN apresentaram respectivamente 582, 619, e
1 Peso ao nascer vs
maturidade anatomofisiológica
O grau de atraso no desenvolvimento e maturação fetal é um importante fator
predisponente para o aumento da mortalidade pré-desmame. Este atraso envolve
características como eficiência placentária, maturação funcional dos órgãos
vitais e disponibilidade de reservas energéticas [45,72]. Ao comparar
leitegadas com mesmo PN, foi observado que aquelas com maior chance de
sobrevivência apresentaram peso do fígado, glândulas adrenais, intestino
delgado, e estômago (7,1%, 21,7%, 5,4%, e 4,3%, respectivamente) superior às
com menor chance, diferindo, apenas, o baço, que apresentou peso 6,1% inferior
[45].
O cortisol, por sua vez, estimula e regula a maturação e o desenvolvimento
de vários órgãos importantes na sobrevivência após o nascimento [46], além de
estimular a deposição de glicogênio muscular e hepático [69] e maturação dos
pulmões, trato gastrointestinal e tireóide [46,73].
Assim, as concentrações médias de cortisol são maiores em leitões que
apresentam uma maior taxa de sobrevivência [45].
A reserva total de glicogênio corporal em leitões recém-nascidos gira em
torno de
FATORES QUE INFLUENCIAM O PESO DO LEITÃO AO NASCER
1 Fatores genéticos
1.1 Hiperprolificidade
Em virtude do intenso processo de melhoramento genético, houve um aumento de
produção de uma média de 10,9 leitões nascidos totais na década de 90, para
13,7 em 2006 [76]. Entretanto, com a seleção de fêmeas voltadas para a produção
de maior quantidade de leitões por leitegada, houve, consequentemente,
a ocorrência da diminuição do PN e um aumento na variação do peso destes [18,56,67,87], como comentado anteriormente. Isto ocorre,
pois há uma diminuição do espaço uterino para todos os fetos que se encontram
em desenvolvimento. Este evento por sua vez, é determinado ao redor do 15º ao
16º dia de gestação, momento em que há um aumento da associação entre microvilosidades do endométrio e do concepto, através da interdigitação de ambos [19]. Esta adesão entre concepto e
endométrio é fundamental para que seja delimitado o espaço uterino disponível
para cada concepto competir pelos nutrientes necessários para sua
sobrevivência, e assim permitindo um bom desenvolvimento [31].
Esta diminuição do PN foi comprovada por Quiniou et al. [67], que observaram uma
redução da média do PN de
Amaral Filha [2] verificou que leitoas inseminadas que tinham
um maior GPD (
Um experimento realizado por Roehe [72] demonstrou
que a seleção genética para aumento no PN é recomendada, possibilitando uma
melhor viabilidade e crescimento pré e pós-natal [87]. Além disso, fatores
genéticos foram relacionados à variação de PN dentro de uma mesma leitegada [17,42,72], sendo que Knol et al. [42] observaram que a influência dos genes maternos
é muito maior quando comparado aos genes de seus leitões, sendo a herdabilidade para essa mesma característica de 0,005 para
efeitos diretos nos leitões, e 0,20 para efeitos genéticos maternos.
Outro fator importante a ser destacado é que, atualmente, a menor deposição
de gordura corporal das fêmeas, resulta em menor reserva de gordura durante a
fase de gestação, o que poderá culminar em um maior desgaste destas matrizes
durante a lactação. Este estado de catabolismo, consequentemente,
poderá afetar seu desempenho reprodutivo subsequente
[77], podendo comprometer o bom desenvolvimento fetal em sua próxima gestação
[8,66].
1.2 Capacidade uterina e eficiência
placentária
De acordo com Père et al. [63] e Van Der Lende
& Schoenmaker [81], a capacidade uterina pode
afetar o tamanho da leitegada e o PN dos leitões. O PN é altamente dependente
da quantidade de nutrientes fornecidos através da placenta, sendo influenciado pelo tamanho (massa, superfície) e fluxo
sanguíneo [42], características intimamente relacionadas à eficiência
placentária (EP).
A EP, por sua vez, é medida através da divisão do PN do leitão pelo peso de
sua placenta [86]. Uma EP elevada permitiria que placentas menores fossem
capazes de manter o desenvolvimento fetal adequado, sem afetar sua viabilidade
[10,85].
A formação da placenta apresenta um desenvolvimento expressivo do 12º a 30º
dia de gestação, sendo que após este período a placenta encontra-se
completamente formada [24], entretanto, seu crescimento continua até em torno
do 70º dia de gestação. Já as membranas embrionárias crescem rápido dentro de
um período que vai do 20º a 60º dia de gestação. Posteriormente, esta taxa de
crescimento diminui consideravelmente, sendo que ao 70º dia de gestação a placenta
e o embrião encontram-se com pesos semelhantes. Neste
momento, a placenta cessa seu crescimento, porém os fetos continuam a se
desenvolver até o momento do nascimento [53].
Em virtude dos fetos necessitarem de um determinado espaço para seu desenvolvimento
e sobrevivência, o comprimento do útero parece ter um papel importante na
definição do tamanho da leitegada [9]. No período final do processo de
alongamento dos embriões (ao redor de 16 dias) seu comprimento gira em torno de
Na medida em que o número de embriões não é um fator limitante, uma placenta
pouco eficiente passa a ser a principal responsável pelo aumento da taxa de
mortalidade pré-natal [85]. Isto se torna uma característica importante, uma
vez que o desempenho pós-natal é determinado, em grande parte, pelo
desenvolvimento intrauterino [28].
Um estudo associando a variação do PN de leitões, sua sobrevivência
pré-desmame e seu GPD, concluiu que a seleção genética para o aumento do tamanho
da leitegada, o qual induzirá diminuição do PN e aumento da variação do peso da
leitegada não seria o mais indicado. A capacidade uterina se tornaria um fator
limitante, a não ser que algumas medidas fossem tomadas no intuito de melhorar
a sobrevivência da progênie de baixo PN [56].
A herdabilidade encontrada para a EP é superior à
observada para a capacidade uterina ou nascidos totais [79]. Neste sentido, Vonnahme et
al. [83] sugerem que a seleção com base nessas características poderia resultar
em uma diminuição de perdas fetais, uma vez que fêmeas selecionadas para uma
alta EP tiveram 3,3 leitões/ leitegada a mais que as selecionadas para uma
baixa EP (12,8 vs. 9,5 leitões) [84].
Ao avaliarem a EP no intuito de verificar o quão melhor
esta característica é em relação ao PN e peso de placenta para predizer
o risco de mortalidade pré-desmame, Van Rens et al. [82] observaram que a EP é uma característica
complicada de ser avaliada, uma vez que o efeito da EP sobre risco de
mortalidade pré-desmame é altamente dependente do PN e peso de placenta, sendo
que dessas duas características, o PN é visto como o melhor preditor
para o efeito da EP sobre a mortalidade pré-desmame.
A estimativa genética de valores para sobrevivência dos leitões está
relacionada positivamente com a EP e inversamente com o peso da placenta [45].
Entretanto, há um fator limitante que é determinado pela capacidade uterina,
uma vez que a EP aumenta de acordo com o aumento do PN, porém somente até
atingir um peso máximo em torno de
Além da EP, a densidade e o número total de aréolas foram as
características placentárias mais importantes no que diz respeito à
sobrevivência pós-natal [6] (Tabela 1).Estas estruturas são os principais
sítios de transferência de nutrientes no útero, surgem em torno do 30º dia de
gestação e apresentam um tamanho individualmente semelhante a uma glândula
uterina numa fase mais precoce da gestação. Em uma fase mais avançada, aumentam
em tamanho e número, levando a fusão de algumas, formando, então, aberturas
glandulares múltiplas [24]. Aréolas mais densas melhoram o ambiente intrauterino, chances de crescimento, desenvolvimento e
sobrevivência dos leitões [6].
1.2.1 Diferenças entre raças
Sabe-se da existência de diferenças inerentes às raças no que diz respeito à
prolificidade. A raça Meishan,
por exemplo, apresenta menor tamanho de placenta e melhor EP quando comparada a
raças européias e americanas [9]. Isto significa que os fetos Meishan, por ocuparem um menor espaço uterino, possibilitam
uma maior sobrevivência embrionária [25], consequentemente,
produzindo um maior número de leitões e mais homogêneos [85].
A EP é maior na raça Meishan, portanto, mesmo que
a placenta não cresça muito no final da gestação, ela apresenta uma proliferação
significativa de vasos sangüíneos na membrana corio-alantóide,
em contraste com a placenta de fetos Yorkshire
[10,25]. Ao analisarem o peso da placenta de leitões Meishan
e Yorkshire aos 90 dias de gestação e ao parto,
Wilson et al. [85] verificaram
que placentas de fetos Meishan apresentaram pesos
similares tanto aos 90 dias quanto ao parto, já em contrapartida, placentas de
fêmeas Yorkshire, apresentaram um aumento de peso em
torno de 70% dos 90 dias de gestação até o parto. Fica evidente, então, que nas
fêmeas Meishan o fluxo sanguíneo placentário assume
grande importância para que a placenta seja mais eficiente na disponibilização
de nutrientes para o feto. A adequada angiogênese da
placenta é crítica para o estabelecimento da circulação placentária e
manutenção de fluxo sanguíneo uterino e umbilical adequados para o crescimento
normal dos fetos. Fatores que influenciam os aspectos de desenvolvimento e
função da vascularização da placenta podem ter efeito marcante no crescimento
fetal e, portanto, com consequências na sobrevivência
e crescimento neonatal.
Ao comparar o desempenho de quatro raças (Large
White (LW), Meishan (MS), linha macho Laconie (LA) e F1 Duroc X Large White (DU x LW)), foi observado que as fêmeas MS
tiveram maior (P<0,01) tamanho de leitegada (13,3 vs 12,2 vs 12,8 vs 11,3 ), menor (P<0,01) número de natimortos (0,3 vs 0,7 vs 0,6 vs
0,7,) e menor (P<0,001) PN (1,32 vs 1,51 vs 1,54 vs 1,53 ) que fêmeas LW,
DU x LW e LA, respectivamente [11].
O interesse pela raça Meishan
tem sido justificado por sua alta prolificidade,
baixo percentual de natimortos e alta taxa de sobrevivência do nascimento ao
desmame [33], sendo que atualmente uma das estratégias mais utilizadas para
aproveitar a vantagem do alto desempenho reprodutivo dessas fêmeas, tem sido o
desenvolvimento de novas genéticas, através do cruzamento entre raças chinesas,
européias e americanas [92].
Dois são os aspectos que explicam a maior prolificidade
da raça Meishan: o primeiro está relacionado à menor
taxa de crescimento inicial, resultando em uma menor produção de estradiol e
mudanças menos marcantes e mais graduais na composição do histiotrofo
uterino, indicando, então, um maior número de conceptos após os 18 dias de
gestação [25,54]; o segundo fator é atribuído a uma placenta menor, de alta EP,
ocupando um menor espaço uterino, e não diminuindo a viabilidade fetal [85].
1.3 Restrição do crescimento
intra-uterino (IUGR)
A capacidade funcional da placenta é essencial para uma perfeita harmonia do
desenvolvimento dos leitões que compõe uma leitegada. Logo após a implantação
do embrião, há a expressão de diversos genes, os quais têm como principal
função iniciar o processo de placentação [3]. Este processo, por sua vez,
envolve uma relação íntima entre placenta e feto, e alguns processos
regulatórios devem já estar pré-programados pela ativação destes genes [91].
O desenvolvimento da placenta dos leitões é estimulado por fatores
regulatórios do crescimento representados pelo fator de crescimento semelhante
à insulina (IGF) e fator de crescimento vascular endotelial (VEGF) [19].
Durante seu desenvolvimento, a placenta forma estruturas
que se ligam ao endométrio, formando uma superfície de contato essencial para a
troca de nutrientes e gases entre mãe e feto. Além disso, esta superfície
promove o desenvolvimento de um fluxo sanguíneo através da vasodilatação
de veias placentárias [76]. Uma boa vascularização da placenta é fundamental
para que haja uma boa suplementação de aminoácidos aos fetos. Um fator
extremamente crítico é a formação de novos vasos sanguíneos a partir de vasos
já pré-existentes, denominado angiogênese, que ocorre
na parede do endométrio, em resposta a um aumento da demanda de substratos para
os tecidos. Em contraste, a vasculogênese ocorre
somente nos conceptos e envolve a diferenciação das células mesenquimais
em angioblastos [74].
Sabe-se que aminoácidos da família da arginina (arginina, prolina e glutamina) são substratos essenciais para um bom
desenvolvimento da placenta e de fetos suínos [89], sendo a arginina precursora
do óxido nítrico (NO) e responsável pela síntese de poliaminas
(Figura 1). O NO tem um papel extremamente importante, no que diz respeito à
vascularização da placenta e na regulação de seu fluxo sanguíneo, sendo, consequentemente, responsável pela transferência de
nutrientes e oxigênio (O2) da mãe para o feto. Uma redução em sua síntese e/ou
liberação, certamente, levaria a uma alteração deste suprimento. As poliaminas, que são sintetizadas na placenta suína a partir
de substratos derivados da prolina, regulam o DNA e
síntese protéica, estando diretamente relacionadas à proliferação e
diferenciação celular [90]. O NO e as poliaminas são
as chaves reguladoras da angiogênese, embriogênese, assim como do crescimento placentário e fetal
[89].
Uma vascularização insuficiente da placenta e um menor
fluxo sanguíneo leva a uma deteriorização
progressiva da função placentária, levando a diminuição da transferência transplacentária de O2 e nutrientes para os fetos,
resultando em uma IUGR [30]. Esta IUGR, de modo geral, pode ser definida como
um comprometimento no crescimento e desenvolvimento de embriões e/ou fetos de
mamíferos durante a gestação [91]. Na espécie suína, trata-se de um fenômeno
comum em fêmeas hiperprolíficas, uma vez que há uma
intensa disputa intrauterina entre os fetos. Fêmeas Meishan aparecem como uma exceção no que diz respeito à
ocorrência da IUGR, pois apesar de serem hiperprolíficas
e apresentarem, relativamente, uma placenta mais leve, elas apresentam um alto
grau de vascularização da mesma, o que permite uma melhor troca materno-fetal
[25].
Figura 1. Mecanismo
pelo qual a arginina promove o crescimento placentário e fetal. Fonte: Adaptado
de [89].
O mecanismo que leva a essa insuficiência placentária e, consequentemente,
à IUGR foi revisado por Wu et
al. [91], e envolve uma interação complexa entre genética, epigenética,
fatores ambientais, bem como a maturidade materna. Estes mesmos autores sugerem
que a trajetória do crescimento da placenta e do feto é naturalmente vulnerável a uma subnutrição, supernutrição,
estresse térmico, doenças e toxinas durante a gestação, porém, a IUGR é
potencializada caso este distúrbio nutricional ocorra no período em que há um
máximo crescimento da placenta.
Muitas leitegadas apresentam ao menos um leitão com baixo PN, sendo que na
maioria dos casos, este baixo PN se trata de um exemplo da ocorrência da IUGR
[5]. Essa IUGR gerada, como já dito anteriormente, resulta em menor PN [20,51,71], o qual está diretamente relacionado à sua
sobrevivência, peso ao desmame e desempenho subsequente
[67]. Este menor PN contribui com 37% na variação do peso ao desmame [15].
Dados de Furtado [29] confirmam tais resultados, uma vez que houve uma
correlação positiva (r= 0,515; P<0,001) entre o PN
e ao desmame, e, além disso, verificaram que para cada grama a mais ao
nascimento houve um incremento de
1.4 Miogênese
Nas espécies multíparas, como na suína, há naturalmente uma variação no PN,
sendo esta variação fortemente relacionada com o número de fibras musculares
presentes. Leitões com menor PN apresentam um menor número de fibras
musculares, sendo decorrente de um menor número de fibras que se diferenciaram
durante o período de miogênese pré-natal, por motivos
genéticos (cruzamento, genótipo) ou maternos (nutrição). Este número de fibras
reduzido torna estes leitões menos capazes de apresentar uma recuperação em
termos de desempenho e ganho de peso no período pós-nascimento [71].
1.4.1 Formação das fibras musculares dos leitões durante a gestação e
desempenho pós-nascimento
O desenvolvimento das fibras musculares dos leitões durante a gestação
ocorre em duas etapas distintas (Figura 2) [7]:
Figura 2.
Representação esquemática dos períodos de desenvolvimento das fibras musculares
nos fetos suínos. Fonte: Adaptado de [28].
Estudos revelaram a presença de quatro grupos de fatores reguladores da miogênese (MRFs): myoD, myf5, myogenin
e MRF4 (myf6), sendo que todos podem ativar a diferenciação da musculatura
esquelética. Estes MRFs consistem num grupo de
fatores de transcrição responsáveis pela regulação central do programa de
desenvolvimento muscular esquelético [52] Experimentos demonstraram que o myoD possui uma função principal
na formação e na sobrevivência dos mioblastos,
desempenhando um importante papel na diferenciação do mioblasto,
enquanto acredita-se que o myogenin está envolvido na
diferenciação final em miotubos [70].
O processo de miogênese, por sua vez, pode ser
afetado pela superlotação uterina. Diferenças relacionadas a esta superlotação
durante o período pré-natal levam a consequências no
padrão do desenvolvimento das fibras musculares [26] e, consequentemente,
causando uma IURG. Num experimento desenvolvido por Town
et al. [78] foi verificado
um efeito moderado do processo de superlotação uterina na expressão de fatores
reguladores da miogênese, como myogenin
e myoD. Os autores concluíram que a superlotação intrauterina aos 30 dias de gestação pode causar um impacto
na diferenciação das fibras musculares em virtude da redução da expressão da myogenin.
Estes resultados demonstrados acima sugerem que alterações no ambiente uterino
durante períodos precoces da gestação podem comprometer o bom desenvolvimento
embrionário e fetal levando a diferenças inerentes ao peso da leitegada e, consequentemente, prejudicando o desempenho pós-natal do
leitão.
2 Fatores nutricionais
A nutrição da fêmea suína é uma área bastante explorada e de constantes
desafios no sentido de atender matrizes atualmente mais precoces, mais
produtivas e, nutricionalmente mais exigentes. As
práticas de alimentação das diferentes categorias de fêmeas embora tenham
objetivos específicos, estão interrelacionadas,
o que faz com que o programa de nutrição em uma determinada fase tenha efeitos
significativos no desempenho alcançado na fase subsequente
[1]. Todas as fases da gestação são importantes quanto à nutrição, sendo
necessário adequar os níveis nutricionais para cada uma delas, pois o alimento
é fornecido de forma restrita. O não cumprimento destas exigências influencia a
taxa de crescimento e desenvolvimento dos fetos no útero e consequentemente
o PN [13]. Na espécie suína, uma suplementação inapropriada de nutrientes no
útero, resulta em
2.1 Fase inicial da gestação
(primeiros 21 dias)
Esta fase caracteriza-se pela ligação embrio-maternal,
início da formação da placenta e anexos fetais, o que exige, portanto, menor
necessidade de ganho de peso e reserva energética da fêmea. Neste período,
tanto uma subnutrição como uma supernutrição pode ser
prejudicial. Uma alimentação deficiente pode resultar em menor síntese de NO e
de poliaminas, o que resulta, como já dito
anteriormente, em menor vascularização placentária e transferência de
nutrientes da mãe ao feto. Isto leva à subnutrição fetal, comprometendo o
crescimento intrauterino [89].
Por outro lado, altos níveis de consumo alimentar durante o início da
gestação também podem exercer influência negativa sobre a sobrevivência
embrionária. Isto é atribuído à redução da concentração de progesterona
plasmática, devido ao aumento do fluxo sanguíneo e do catabolismo hepático
deste hormônio, causados pelo alto consumo de alimento [18]. Por sua vez, a
progesterona influencia as atividades secretórias do útero e do oviduto necessárias para o embrião em desenvolvimento [27].
O período crítico para sobrevivência embrionária compreende as primeiras 48 e
72 horas da gestação, onde então, recomenda-se limitar o consumo de ração [40].
A condição corporal ou o estado energético da fêmea influencia a resposta
desses animais a altos níveis de consumo alimentar, sendo que a mortalidade
embrionária somente aumenta quando altos níveis de alimentos são fornecidos a
fêmeas que apresentam boas condições corporais [1].
2.2 Fase intermediária da gestação (
Trata-se de uma fase da gestação em que há a recuperação das reservas
corporais das fêmeas, mobilizadas na lactação anterior. A
nutrição após o período crítico inicial da prenhez e
até o início do terço final da gestação influencia mais a composição corporal
da fêmea do que o tamanho da leitegada ou o peso dos leitões [13], apesar de
ser nessa fase em que há o estabelecimento do número de fibras musculares nos
fetos.
Em virtude da hiperplasia das fibras musculares já estar cessada no momento
do nascimento, o nível de hipertrofia e a massa corpórea final dependerá do
número de fibras musculares formadas durante o desenvolvimento fetal.
Acredita-se que a heterogeneidade dentro de uma mesma leitegada esteja
relacionada a uma baixa taxa de crescimento das fibras musculares secundárias
[21,26]. Segundo alguns estudos, uma subnutrição uterina durante este período
poderia afetar o PN, pela redução do número de fibras musculares secundárias.
No entanto, os trabalhos sobre a influência da alimentação materna vs miogênese
dos fetos tem apresentado resultados contraditórios.
Ao avaliarem o crescimento de leitões desde o nascimento até atingirem
Um efeito mais pronunciado no número de fibras secundárias foi observado
quando o aumento no nível nutricional foi efetuado no período que precede a
hiperplasia das fibras secundárias (25 - 50 dias de gestação) [22]. Por outro
lado, Musser et
al. [57] e Nissen et al. [59], ao aumentarem o consumo
energético das fêmeas, entre os dias 29 e 45 e 25 e 50 de gestação,
respectivamente, não encontraram algum efeito sobre o número de fibras
musculares e peso dos fetos. Mais recentemente, Bee
[7] verificou que a alimentação não influenciou o número de fibras musculares,
embora tenha alterado o tipo de fibra muscular.
O efeito da utilização de somatotropina (pST) e L-carnitina
tem sido avaliado em vários estudos. A administração de pST em fêmeas entre os dias 28 e 42 dias de gestação
reduziu a variação de peso dos fetos [75], enquanto, que leitões de fêmeas que
receberam L-carnitina na gestação apresentaram maior
taxa de crescimento durante o período de amamentação do que leitões do grupo
controle [23,68]. Fêmeas alimentadas com L-carnitina
durante a gestação (5º ao 112º dia) apresentaram maiores concentrações de
insulina e IGF-I entre 60 e 90 dias, período de desenvolvimento das fibras
musculares secundárias do feto. A adição de L-carnitina
na dieta melhorou a utilização dos nutrientes dietéticos, resultando em um
aumento do peso das reservas de gordura e um maior PN. Os efeitos positivos da
administração de pST e L-carnitina [58] estariam relacionados a possível elevação
dos níveis de IGF-I, o que, segundo Magri et al.[50],
seria importante na proliferação e diferenciação das células miogênicas,
melhorando o crescimento pós-natal dos leitões.
2.3 - Fase final da gestação (76 dias
até o parto)
Nesta fase a necessidade de ganho e reserva energética torna-se,
expressivamente, maior quando comparada aos dois períodos anteriores, uma vez
que representa a fase de maior intensidade de crescimento fetal. O aumento do
consumo energético e protéico no último terço de gestação pode aumentar o PN.
Este efeito pode ser de vital importância para as linhagens hiperprolíficas,
com tendência a um maior crescimento materno e maior número de leitões de baixo
PN. Entretanto, o excesso de energia, entre os 75 e 90 dias de gestação pode
resultar em prejuízo na formação da glândula mamária e, consequentemente,
menor produção de leite durante a lactação, especialmente em primíparas [36].
Fêmeas alimentadas com 1,82 kg/dia (5.900 Kcal/dia) em
relação a fêmeas que recebiam 2,27 kg/dia (7.400 Kcal/dia) apresentaram
leitegadas mais pesadas [14]. Por outro lado, King et al. [41] observaram que o aumento da quantidade de
ração fornecida e do teor de proteína da dieta entre os 66 e 101 dias de
gestação não influenciaram significativamente o PN. De acordo com Close &
Cole [13], há um acréscimo de
Deve ser considerado que o maior fornecimento de energia durante a gestação
pode resultar em um menor consumo de ração durante a lactação. Portanto, se faz
necessária uma perfeita integração entre essas duas fases, para que seja
alcançado um melhor desempenho reprodutivo das matrizes, e, consequentemente,
uma maior longevidade das mesmas dentro do plantel reprodutivo.
Com a intensa seleção genética para deposição de massa muscular, tem-se
verificado que o metabolismo protéico em fêmeas gestantes e suas exigências de
aminoácidos essenciais alteraram. Lima et
al. [48] avaliaram os efeitos da ingestão de diferentes níveis (10,0; 13,5 e
17,0) de PB durante a gestação, do primeiro ao terceiro parto, sobre os
desempenhos produtivo e reprodutivo. O aumento do peso das fêmeas a cada ciclo
consecutivo influenciou o PN médio da leitegada e o peso ao desmame,
independentemente do nível de PB da ração de gestação. Por outro lado, Haley et
al. [33] observaram aumento no peso dos leitões ao nascimento ao fornecerem
níveis crescentes de PB na ração de gestação.
O perfeito entendimento das quantidades diárias de
nutrientes necessários para o máximo desempenho de fêmeas e o controle
constante do consumo diário de nutrientes possibilitam a formulação
adequada de rações para garantia do sucesso na produção de suínos [47]. No
entanto, existem poucos estudos sobre o efeito da nutrição em fêmeas suínas de
alto potencial e estes apresentam resultados variáveis, principalmente quando
considerados vários ciclos reprodutivos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O peso do leitão ao nascimento é um fator extremamente importante, inicialmente,
para sua sobrevivência, e, posteriormente, para um bom desempenho até o momento
de abate.
Fêmeas hiperprolíficas produzem um maior número de
leitões nascidos por leitegada, o que resulta em menor peso médio ao nascimento
e, consequentemente, maior variabilidade de peso
desses leitões. A capacidade uterina entra, neste aspecto, como um fator
limitante, uma vez que se trata de uma característica, anteriormente já
explorada em processos de melhoramento genético na tentativa de aumentar o
tamanho da leitegada.
Portanto, características como eficiência placentária e tamanho de placenta
devem ser incluídas em programas de melhoramento genético, uma vez que se tratam de aspectos vistos como essenciais para a produção de
leitões mais homogêneos e, consequentemente, de
melhor viabilidade. A nutrição e o manejo alimentar por sua vez, devem ser
realizados minuciosamente, sempre respeitando as diferentes fases reprodutivas
em que as fêmeas se encontram, no intuito de
proporcionar uma alta qualidade nutricional e assim um bom peso do leitão ao
nascimento. Esses dois fatores associados, genética e nutrição, certamente,
auxiliarão no aumento da sobrevivência dos leitões durante a fase de lactação e
com isso, contribuindo positivamente com a diminuição da taxa de mortalidade na
maternidade e com o aumento do ganho econômico da produção.