Autor : Robson Carlos Antunes (Professor da Famev - UFU), Ana Carolina Portella Silveira, Aline Silva
Mello César,Paulo Fernando Alves de Freitas
Introdução
Pode-se afirmar que o melhoramento genético dos suínos
alcançou as metas, tão almejadas nas décadas de 60 e 70, de produção de
carcaças com baixo percentual de toucinho, maior profundidade e maior área de
olho de lombo, resultando em alto percentual de carne magra produzida por
animal abatido, em um intervalo de tempo cada vez menor, devido às altas taxas
de crescimento diário. Esta produção se dá com custos também cada vez
menores, fruto da melhoria da conversão alimentar, imprimido, principalmente
pelo componente paterno das linhagens comerciais. Em relação às características
advindas do componente materno, também houve um grande avanço a partir da
década de 80, que se concretizou na década de 90 e continua até os dias atuais.
Em termos numéricos, o melhoramento genético dos suínos, considerando as
linhagens paternas e maternas, proporcionou, em média, progressos genéticos
anuais da ordem de +
Adicionalmente, devido à resposta correlacionada(05), algumas características
pioraram e, atualmente, as taxas de mortalidade de leitões nas fases iniciais
de vida aumentaram muito, contribuindo para a diminuição da velocidade do
progresso genético da característica número de leitões desmamados por porca ano (D/P/A), mesmo com grande progresso genético na
característica tamanho de leitegada (TL)(06). O mesmo foi encontrado em
linhagens de camundongos selecionadas para tamanho da ninhada comparado a uma
linhagem controle que foi mantida sob cruzamento aleatório por vinte gerações,
ou seja, um aumento do número de filhotes por parto
e um aumento concomitante da mortalidade pré-desmame na linhagem
selecionada(24). Considerando que a mortalidade de leitões
não é importante apenas do ponto de vista econômico e de produção, mas também
do ponto de vista de bem estar animal e social, já que a sociedade não aprecia
o fato de grande número de leitões morrerem em sistemas intensivos de produção
e não aprova o sacrifício de animais doentes ou refugos(31), torna-se
necessário o investimento no melhoramento genético de características que
propiciem o aumento da sobrevivência dos leitões.
A soma do melhoramento genético
paterno e materno continua trazendo ótimos beneficios
para produção como conversão alimentar e alta taxa de crescimento diário.
Estratégias de aumento da taxa de sobrevivência
dos leitões pelo melhoramento genético podem ser implementadas
focando a habilidade materna das linhas fêmeas ou ainda o aumento da
resistência inata dos leitões às condições adversas enfrentadas no ambiente
extra-uterino logo após o nascimento ou também, melhorando geneticamente os
leitões no tocante à resistência a doenças específicas; e, logicamente, uma
combinação de todas estas estratégias. Há necessidade de lembrar que o componente longevidade das matrizes influencia diretamente
a lucratividade e a eficiência do sistema de produção de leitões(28).
Aumentando a sobrevivência por meio do componente materno
Para fazer melhoramento genético para a habilidade materna da porca, seja
pelo aumento da produção de leite ou da eficiência da lactação(1), já que a
produção de leite da porca é um dos fatores mais importantes da limitação do
crescimento do neonato(15); ou pelo melhor comportamento da matriz ao expor os
tetos e pelo som característico emitido para chamar os leitões para mamar, e
ainda, pelo comportamento cuidadoso ao deitar evitando o esmagamento(25), ou
ainda pela combinação destas características, é necessário tomar alguns
cuidados nos programas de melhoramento genético. As granjas núcleos de
melhoramento genético que selecionam para a característica
habilidade materna não devem usar hormônios para induzir o parto e,
muito menos, para auxiliar a expulsão dos leitões após o parto iniciado. Em
recente trabalho conduzido no México, os autores mostraram que a administração
de ocitocina para auxiliar o parto tem efeito adverso
sobre a viabilidade do neonato provocado pelo número, freqüência e intensidade
das contrações miometriais, levando a um aumento do
número de leitões que nascem com bradicardia e com
acidose metabólica(18). O uso de ocitocina também
aumenta a chance dos leitões sofrerem intervalos de hipóxia
antes do nascimento, aumentando a mortalidade na maternidade(19). Mesmo assim,
o uso da ocitocina no auxílio ao parto tem aumentado
em granjas comerciais, pois esta prática diminui a duração total do parto e o
intervalo entre a expulsão dos leitões, otimizando a
mão-de-obra em grandes unidades produtoras de leitões, apesar de aumentar
também a incidência de partos distócicos, além dos
problemas mencionados com os neonatos(29).
Uma pesquisa conduzida pelo National Pork Producers Council (NPPC) nos Estados Unidos (EUA) mostrou que há
diferenças enormes com respeito à longevidade das fêmeas e capacidade
reprodutiva entre linhagens(17). Estas diferenças, certamente, também devem se
estender ao comportamento destas matrizes, pois, apesar destas pesquisas não
terem estudado características comportamentais especificamente, o peso da
leitegada e a perda de peso durante a lactação foram estudados neste projeto e
ambos são afetados pelo comportamento da fêmea na maternidade.
Investir no melhoramento genético da característica
habilidade materna é possível, já que os vários componentes desta
característica são herdáveis(1), e necessário, pois há grande variação entre as
linhagens comerciais dos resultados de produção(17) que também são conseqüência
do comportamento materno, entre outros fatores. No entanto, é importante
lembrar que para se calcular valores genéticos para determinados
componentes da característica habilidade materna, deve-se corrigir
estatisticamente para a vitalidade inerente dos leitões que a porca amamentou
em cada ciclo(9).
Finalizando, deve-se evidenciar que um dos componentes mais importantes
da
característica habilidade materna, que é a
produção de leite, pode ser
melhorado selecionando fêmeas com boa conformação
de úbere durante o período de
lactação, pois existe correlação positiva
entre produção de leite e conformação
do úbere(20). Mas, tem-se que considerar as respostas
correlacionadas para as
outras características, buscando o melhor balanço entre
elas(1).
Melhoramento genético para resistência a doenças específicas
Uma pesquisa conduzida na Universidade de
Nebraska pelo grupo liderado pelo Dr. Rodger K.
Johnson mostrou que as linhas paternas selecionadas para altas taxas de
crescimento em carne magra, quais sejam Pietrain, Duroc ou Hampshire, são mais
sensíveis aos efeitos deletérios provocados pela infecção pelo vírus da
PRRS(21). Desde a década de 70, pesquisas têm sido conduzidas no sentido de desvendar
mecanismos que expliquem a resistência a doenças específicas e com isto, seja
possível o desenvolvimento de marcadores moleculares que possam ser usados no
melhoramento genético por meio da seleção assistida por marcadores(34). Um
exemplo de sucesso nesta área é o desenvolvimento de marcadores para
resistência a colibacilose que já foi concluído,
patenteado e é amplamente utilizado pela PIC (Pig Improvement Company) em seu
programa de melhoramento. Estudos sobre a herança genética deste marcador de resistência
mostraram que a resistência resulta da falta de um simples receptor de
superfície celular para a cepa K88. Desta forma, os leitões que não possuem
este receptor não são colonizados, pois a E. coli cepa K88 não consegue se aderir à mucosa intestinal
destes leitões(34).
A produção de leite da porca é
um dos fatores mais importantes na limitação do crescimento dos neonatos.
A utilização de modelos animais empregando
camundongos e ratos transgênicos, em que alguns genes são silenciados pela
técnica de knout out, é uma ferramenta valiosíssima
na elucidação dos mecanismos moleculares das doenças e tem produzido bastante
conhecimento no caso específico de doenças humanas, como Diabetes e Mal de
Parkinson. A produção de suínos transgênicos tem aumentado nos últimos anos e,
em breve, analogamente ao que já acontece com as pesquisas de doenças em
humanos, estas técnicas serão aplicadas na elucidação dos mecanismos moleculares
que regem as doenças em suínos. Técnicas recentes e com poder maior de
elucidação também serão utilizadas neste sentido como, por exemplo, a recém
desenvolvida técnica de RNA de interferência que gerou um prêmio Nobel. Isto
proporcionará a utilização da estratégia de Marked Assisted Selection (MAS) em maior
escala no melhoramento genético de suínos no tocante ao desenvolvimento de
linhagens resistentes a doenças específicas.
Melhoramento genético para a vitalidade dos leitões
Vitalidade dos leitões é definida como sendo a capacidade dos leitões
sobreviverem da fase final de gestação, passando pelo parto e pelo período
crítico dos primeiros três dias até o desmame(9). Como o
conceito envolve a natimortalidade, é interessante
frisar que é extremamente importante a correta diferenciação dos leitões
natimortos daqueles que nasceram e morreram logo após o parto e, não raramente,
sem a presença do "parteiro", pois a mortalidade fetal é influenciada
por genes da mãe e genes do feto e ocorre em períodos críticos da gestação que
coincidem com as mudanças na placenta(33). Entre os dias 20 e 30 de
gestação, há o maior crescimento da placenta e logo após, entre 35 e 40 dias,
há um pico de mortalidade fetal que pode ser mensurado avaliando-se os leitões
mumificados abaixo de
Produções acima de 30 D/P/A já acontecem em vários locais em nível mundial, às
vezes, com mudanças no manejo com a
intenção de alcançar este tipo de meta, cobrindo marrãs com 160kg
aos 270 dias e as mantendo como mães de leite na primeira lactação, alongando o
período de lactação para 30 dias, com efeito benéfico sobre a reprodução no
próximo parto(22). Mas um dos maiores problemas que impede que um número maior
de unidades produtoras ultrapasse a barreira dos 30 leitões D/P/A é o aumento
da mortalidade que aconteceu nas linhagens maternas como resposta
correlacionada negativamente com a característica tamanho de leitegada(6). Uma
possível explicação para o aumento da mortalidade dos leitões é o fato de que
rações de gestação com balanço inadequado de aminoácidos ideal possam levar
leitões a termo com deficiências nutricionais já ao parto, o que proporcionaria
uma diminuição da vitalidade destes leitões. Os trabalhos de Kim e Wu, 2005
mostram que há uma necessidade de se formular rações específicas para a fase
inicial e final da gestação no tocante ao balanço de aminoácidos ideal e também
considerar as diferenças entre primíparas e
multíparas(8). O manejo de se usar apenas um tipo de ração gestação com o mesmo
nível adequando apenas a quantidade para as diferentes fases da gestação e
categoria de fêmeas gestantes certamente não está em concordância com os resultados
destas pesquisas.
Os leitões
mais pesados ao nascer tem mais chances de sobreviver, devido a menor
probabilidade de sofrer hipotermia.
Quando se pensa em melhorar esta característica, vem logo em mente a
estratégia de se aumentar o peso ao nascer dos leitões, pois leitões mais
pesados têm mais chances de sobreviver, já que a probabilidade de sofrerem
hipotermia é menor(31). Mas, paradoxalmente, em uma revisão publicada sobre
este tema são citados vários trabalhos que mostram que selecionar para o aumento do peso ao nascer não aumenta a sobrevivência dos
leitões e a explicação dada para esta contradição é o fato de que são genes
diferentes que controlam o peso ao nascer e a maturidade fisiológica do leitão,
sendo mais eficiente selecionar para aumentar a uniformidade de peso dentro de
leitegada para elevar indiretamente a taxa de sobrevivência até o
desmame(2).
Pensando em selecionar características comportamentais dos leitões que, por
conseqüência, aumentaria a taxa de sobrevivência, uma pesquisa foi conduzida em
rebanhos núcleos de melhoramento, em que foi avaliado o comportamento de dois
grupos de leitões com relação ao mérito genético para a característica vitalidade
logo após o parto e durante as primeiras 24 horas, medindo o tempo gasto do
nascimento até o leitão ficar de pé, tempo gasto até o primeiro contato com o
úbere e o tempo que o leitão levou do nascimento até colocar o teto na boca.
Estas características comportamentais não explicaram a diferença de mérito
genético para a característica vitalidade(12).
Este mesmo grupo de pesquisadores continuou aprofundando o assunto para tentar
explicar as diferenças encontradas em relação ao mérito genético para a
característica vitalidade dos leitões e conduziram outras pesquisas buscando
diferenças de estoques de energia nos dois grupos de leitões com relação ao
mérito genético e encontraram no grupo de maior mérito genético uma maior
quantidade de glicogênio muscular e hepático, maior conteúdo
de gordura, maior peso de adrenal, níveis mais elevados de corticóides
circulantes e melhor eficiência placentária(13). Este grupo de pesquisadores
também mostrou que a seleção para a característica vitalidade dos leitões ao
parto pelo componente materno leva a uma diminuição do número de leitões
natimortos sem diminuir o tamanho da leitegada(14).
Os suínos nascem com pouca reserva de gordura e pobre capacidade gliconeogênica e, portanto, dependem dos estoques de
glicogênio(3). Por este motivo, os achados das pesquisas citadas são bastante
valiosos para explicar diferenças nas taxas de sobrevivências dos leitões. Adicionalmente, outro fato colabora para a convergência destes
resultados na explicação da característica vitalidade, o fator fisiológico
ligado ao parto e à maturidade dos leitões ao final da gestação, que é o
aumento do nível de cortisol, responsável por induzir o pulmão a produzir uma
quantidade adequada de surfactante, que será extremamente importante na primeira
inspiração de cada leitão no momento do parto(4). A importância do
aumento do cortisol na fase final da gestação ligada ao aumento da produção de
surfactante fica clara quando se conhece o fato de que maternidades de humanos
usam surfactante isolados de pulmões de suínos para
aumentar a taxa de sobrevida de crianças que nascem prematuras.
Selecionar para vitalidade dos leitões é possível, eficiente e necessário(9).
Há resposta correlacionada com outras características de interesse econômico e
devem ser balanceadas dentro do programa de melhoramento genético. Interessante
notar que quando se seleciona para vitalidade dos leitões e taxa de
crescimento, concomitantemente, ocorre um ganho extra na taxa de crescimento
comparado a uma estratégia em que se seleciona apenas para taxa de
crescimento(10).
Durante o 8º Congresso Mundial de Genética Aplicada ao Melhoramento Animal (8th
WCGALP-World Congress on Genetics Applied
to Livestock Production),
realizado em 2006 pela primeira vez no Brasil, muitos dos trabalhos de
pesquisas apresentados foram sobre o melhoramento genético para vitalidade dos
leitões. Dos 27 trabalhos apresentados na seção de Melhoramento Genético de
Suínos (Pig Breeding), oito
foram sobre vitalidade dos leitões. Destes trabalhos apresentados em 2006,
muitos já foram publicados em revistas especializadas. Um especificamente traz
uma contribuição interessante, mostrando que selecionar para o número de
leitões que sobreviveram até o 5º dia útil após o parto é mais eficiente do que
selecionar para tamanho de leitegada ao nascer(30).
Considerações finais
Selecionar para a característica vitalidade dos
leitões é possível e necessário e para ser implementado
com eficiência deve-se, além de se controlar os pais biológicos, desenvolver
correções estatísticas para o peso ao nascer, para o efeito da habilidade
materna da mãe de leite, devido à transferência entre leitegadas, pois são
fatores de grande impacto na taxa de sobrevivência dos leitões. A herdabilidade da característica vitalidade dos leitões é muito
baixa, mas a sua grande variabilidade torna-a passível de seleção com
eficiência econômica. O fato de esta característica ser de magnitude bastante
baixa faz com que seja necessário o uso de informações de grande número de
animais geneticamente conectados em ambientes diversos, para aumentar a acurácia de seleção dos valores genéticos e,
conseqüentemente, aumentar o progresso genético para esta característica. A
conseqüência do melhoramento genético para a característica vitalidade dos
leitões é o aumento da uniformidade do peso ao nascer e a produção de leitões
fisiologicamente mais maduros.
Uma das caracteristicas
da habilidade materna é a produção de leite, que pode ser melhorada
selecionando fêmeas com boa conformação de úbere.