Autor :
Gustavo Lima, Nelson Morés e Ronaldo Linaris Sanches.INTRODUÇÃO
Em menos de
quatro décadas, a idade de desmame dos leitões foi reduzida de 56 para 21-28
dias, ocorrendo o desmame de leitões com menos de 21 dias em muitas granjas. O
principal objetivo de se desmamar os leitões mais cedo foi aumentar a
produtividade, possibilitando menor intervalo entre partos e
maior número de leitões produzidos por porca/ano. Independente da idade
de desmame, os leitões são permanentemente expostos a microrganismos presentes
no ambiente desde o nascimento. O desmame antecipado dos leitões amplia as
possibilidades de ocorrências de problemas sanitários, constituindo-se em
grande desafio para a sua sobrevivência. Isto acontece porque eles são
separados do convívio com a mãe, transferidos para um ambiente estranho, sendo
muitas vezes reagrupados com animais de outras leitegadas, além de receber uma
nova dieta com características muito diferentes do leite. A transição da
alimentação à base de leite materno para dieta sólida deve ser iniciada o mais
breve possível na maternidade, de maneira que, ao desmame, os leitões sejam
capazes de se adaptarem rapidamente à dieta sólida como única fonte de
nutrientes. O desmame antecipado dos leitões é frequentemente
acompanhado de atraso no crescimento, às vezes até com perda de peso e
diarréia. Este processo tem origem multifatorial [25,12]. Contudo, os cuidados
com os leitões, principalmente nos primeiros dias após o desmame, são
imprescindíveis para evitar diarréia e outras enfermidades, queda no desempenho
e mortes.
Diarréia é
definida como o sintoma de muitas moléstias, consistindo-se em fezes mais
líquidas e mais frequentes do que o normal, podendo
ser causada por cinco mecanismos. O primeiro é a diferença em pressão osmótica
(diarréia osmótica), a qual é causada pela presença na luz do intestino de quantidades
maiores, que o usual, de solutos de baixa absorção e que possuem atividade
osmótica, tais como carboidratos da dieta ou substâncias laxativas [5]. Neste
tipo de diarréia, os solutos exercem força osmótica através da mucosa
intestinal causando aumento no conteúdo de água no intestino grosso. O aumento
do conteúdo de água é diretamente relacionado à concentração do soluto. Essa
diarréia cessa com a aplicação de jejum nos animais ou quando termina a
ingestão do soluto, que tem baixa absorção (carboidrato ou substância
laxativa). O segundo tipo é a diarréia secretória, que se refere àquela causada
pelo transporte anormal de íons das células do epitélio intestinal ao lúmen,
retendo maior quantidade de água na luz intestinal e, consequentemente
provocando diarréia [5]. Esta condição não é marcada por diferenças em osmolaridade, mas pode ocorrer simultaneamente com a
diarréia osmótica. Doenças infecciosas no trato intestinal podem causar
diarréia secretória, cujo exemplo principal é a enterotoxemia
causada por amostras de E. coli.
O terceiro mecanismo causador de diarréia é a alteração da motilidade
intestinal [10]. A aceleração no trânsito intestinal pode promover menor tempo
de digestão e absorção do alimento fazendo com que o alimento e os fluídos
sejam propelidos em direção à parte final do intestino. Por outro lado, a falta
de motilidade pode promover um crescimento bacteriano
intenso no intestino delgado causando diarréia. O quarto mecanismo que causa
diarréia é a exudação, que ocorre pela inflamação ou
ulceração da mucosa intestinal com liberação de muco, fluidos, proteínas
séricas e sangue da mucosa intestinal [10]. Esses componentes são depositados
na luz do intestino e expelidos através das fezes. Exemplos desse tipo de
diarréia são a disenteria suína e a colite ulcerativa. O quinto tipo é a
diarréia por má digestão e absorção de nutrientes, cuja causa principal é a
hipotrofia das vilosidades provocada por vários agentes, principalmente vírus
[4].
O objetivo
deste artigo é discutir os fatores nutricionais que interferem na ocorrência
das diarréias nos suínos, com ênfase nos animais jovens.
SÍNDROME
DA DIARRÉIA PÓS DESMAME E DOENÇA DO EDEMA
A síndrome da
diarréia pós-desmame é uma doença multifatorial que acomete os suínos nas duas
primeiras semanas após o desmame. Trata-se de uma doença de grande perda
econômica, podendo chegar a 10 % de mortalidade além de provocar aumento de
refugos, atraso no desenvolvimento dos animais e gastos com medicamentos. Esta
doença também é conhecida como colibacilose pós-desmame
porque cepas de Escherichia coli
enterotoxigênicas são os principais agentes. Outros
agentes como a Lawsonia intracellularis,
Salmonella Typhimurium e S.
Choleraesuis podem estar presentes no período
pós-desmame causando enterites e confundindo o diagnóstico e tratamento [22].
A doença do
edema é uma toxi-infecção produzida por E. coli que pode ou não acompanhar a
síndrome da diarréia pós-desmame. Esta enfermidade afeta os leitões no período
de
Tanto a
síndrome da diarréia pós-desmame como a doença do edema estão relacionadas com
a multiplicação exagerada de cepas patogênicas de E. coli no intestino dos leitões e estão associadas à
presença de fatores nutricionais, de manejo e ambiente – os fatores de risco.
FATORES
DE RISCO ASSOCIADOS AOS PROBLEMAS DOS LEITÕES NO PERÍODO PÓS DESMAME
O período de 21
dias após o desmame é considerado uma fase crítica na produção de leitões,
devido à ocorrência simultânea de vários fatores estressantes, já citados. Em consequência, problemas sanitários, como a síndrome da
diarréia pós-desmame e a doença do edema, podem surgir, ocasionando perdas
econômicas pela elevação da taxa de mortalidade e pela redução no ganho de peso
dos leitões afetados. Os agentes infecciosos, causadores dessas doenças,
exercem seus efeitos nocivos sobre os leitões somente em determinadas
circunstâncias, genericamente denominadas de fatores de risco. Logo, a correção
de tais fatores constitue-se em ferramenta útil para
produtores e técnicos no sentido de estabelecer medidas preventivas para
reduzir o uso de medicamentos [9].
Os fatores de
risco para a ocorrência dessas doenças são:
É importante
ressaltar que os fatores de risco não devem ser considerados isoladamente, uma
vez que existem inter-relações entre eles, aumentando as chances de
aparecimento de problemas na fase de creche, quando normalmente se identifica a
ocorrência de um conjunto deles.
Com o objetivo
de identificar o conjunto de fatores de risco que melhor expliquem os problemas
dos leitões na fase de creche, foi realizado um estudo observacional (entre
Tabela
1.
Relação das variáveis objetivas e suas classes com os respectivos valores para
avaliar os problemas dos leitões na fase de creche.
Tabela
2. Relação das variáveis
explicativas e suas classes, associadas com os problemas de diarréias,
mortalidade e ganho de peso dos leitões.
PERFIS
DA COMPOSIÇÃO QUÍMICA DE DIETAS PARA SUÍNOS EM FASE INICIAL DE DESENVOLVIMENTO
São poucas as
informações disponíveis na literatura brasileira sobre a qualidade das dietas
que são utilizadas nessa fase de criação e quais os procedimentos utilizados
pelos suinocultores para produzi-las em suas propriedades. Em pesquisa
realizada paralelamente ao estudo da EMBRAPA [9], nas mesmas granjas, Lima et al. [17] levantaram os perfis
da composição química e do manejo de produção de leitões para identificar
aspectos que poderiam ser melhorados. Suinocultores foram entrevistados sobre
como produziam suas rações, preenchendo-se um questionário para cada
propriedade e coletando-se amostras das dietas nos cochos dos comedouros
utilizados pelos animais. As amostras foram analisadas quanto suas
características químicas, segundo procedimentos descritos na literatura.
Observou-se, na maioria das granjas visitadas, que os leitões continuavam
recebendo dietas préiniciais após o desmame, e que
grande parte dos produtores utilizava restrição alimentar rotineiramente, mesmo
quando não havia ocorrência de diarréia (Tabela 3). Nos casos
de surtos de síndrome da diarréia pós desmame e doença do edema recomenda-se a
retirada imediata da dieta dos leitões, estendendo por um dia, fornecendo-lhes
apenas água medicada ou com eletrólitos, restabelecendo-se o consumo original
após um período de fornecimento de dieta em quantidades gradativas e em várias
refeições. Entretanto, se os leitões não apresentam problemas, o consumo
de ração não deve ser restringido, pois isto implicará em menor taxa de ganho
de peso. O uso de restrição alimentar rotineira demonstra o temor que o
produtor tem com as diarréias, mesmo quando não há o problema, acabando por
limitar o potencial máximo de ganho de peso dos animais. Um número expressivo
de produtores (64,6%) relatou que não usava o óxido de zinco no controle da
diarréia dos leitões. Entretanto, ao se analisar as dietas, verificou-se que
83,1% das amostras apresentaram teores de zinco acima de 300 ppm, sendo que a exigência nessa
fase é de 80 ppm. Isso está relacionado com o fato de
que em todas as granjas eram utilizados núcleos comerciais, dos quais a
composição não era de conhecimento do produtor. Observou-se que 70,8% das
dietas apresentaram níveis inadequados de zinco, sendo 64,6% entre 300 e 1750 ppm e 6,2% acima de 3200 ppm. Em 4 granjas o óxido de zinco, como medida preventiva
contra o aparecimento de diarréia, foi adicionado simultaneamente através do
núcleo e de outro produto, atingindo níveis considerados tóxicos. Com relação à
composição química das dietas, observou-se que um número considerável de
amostras apresentou altos teores de fibra bruta (33,8%), cobre (64,6%) e ferro
(83,1%), além do zinco que já foi discutido. Esses níveis de minerais nas
dietas vem aumentar as preocupações com o potencial poluidor dos dejetos
produzidos pelos animais.
Tabela
3. Características de
manejo dos animais e composição química das dietas utilizadas na recria de
suínos em 65 propriedades da Região Sul do Brasil.
Em um estudo
realizado no Brasil [27], através da aplicação de um questionário a
nutricionistas independentes ou funcionários de grandes empresas brasileiras,
verificou-se que nas dietas pré-inicias e iniciais são adicionados maior número
de aditivos, comparadas às dietas das outras fases de produção de suínos. Os
antibióticos, promotores de crescimento, óxido de zinco, sulfato de cobre,
acidificantes, aromatizantes e antioxidantes apareceram como amplamente
utilizados naquelas dietas. Verificou-se, ainda, o uso reduzido de probióticos, minerais orgânicos, mananoligossacarídeos,
leveduras e enzimas. Na Tabela 4 são apresentados os valores, obtidos através
dos questionários, dos percentuais de nutrientes utilizados pelos
nutricionistas das integrações e independentes em rações pré-iniciais e
iniciais. Observou-se que os níveis de proteína bruta e fósforo total
apresentaram variação acima de 30% entre os respondentes. Embora tenha sido
constatado que as dietas eram formuladas para nutrientes digestíveis, como fósforo disponível e aminoácidos digestíveis, verificou-se a
preocupação de alguns nutricionistas em fixar níveis mínimos de proteína bruta
e cálcio, que podiam chegar a 25% e 0,90%, respectivamente, o que, de certa
forma, confirma a tendência verificada anos antes [17]. No mesmo levantamento
[27], os autores estimaram a composição nutricional das dietas utilizando os
valores de fórmulas fornecidas pelas empresas para as granjas comerciais. Essas
fórmulas foram compiladas em um programa computacional, utilizando uma matriz
única, obtendo- se, os valores de energia metabolizável, proteína bruta,
aminoácidos, cálcio, fósforo, sódio e outros nutrientes, possibilitando uma
avaliação entre as diferenças das matrizes e dos níveis nutricionais utilizados
atualmente (região sudeste do Brasil). Os resultados são apresentados nas
Tabelas 5, 6 e 7. Os autores, à semelhança de Lima et al. [17], verificaram que havia dietas
pré-iniciais e iniciais com níveis inadequados de proteína bruta, cálcio e
zinco.
Tabela
4. Valores máximos, mínimos
e a variação em percentagem dos nutrientes, vitaminas e minerais utilizados
pelos nutricionistas das integrações e independentes em rações pré-iniciais e
iniciais.
Tabela
5.
Níveis nutricionais de rações pré-iniciais I (
O
PROBLEMA DO BAIXO CONSUMO DE ALIMENTO PELOS LEITÕES RECÉM DESMAMADOS
A alteração na
estrutura do intestino delgado constitui-se em importante mecanismo para o
aparecimento de diarréias nos leitões. O baixo consumo de ração verificado após
o desmame pode levar a alterações morfológicas (encurtamento e mudança da forma
das vilosidades, hiperplasia das células da cripta e aumento da mitose no
epitélio celular) e funcionais no intestino [25]. Essas mudanças podem
acarretar em declínio da função intestinal com redução nas atividades
enzimática e absortiva, resultando em diarréia e baixo desempenho nos leitões
desmamados [32]. Assim, é extremamente importante aumentar o consumo de
alimento nos animais desmamados para que a ocorrência de diarréia seja reduzida
e o ganho de peso aumentado. O baixo consumo de ração, após as primeiras 48
horas do desmame, desencadeia mudanças morfológicas no intestino do leitão.
Isto faz com que o epitélio tornese mais permeável
aos antígenos presentes no lúmen acarretando, eventualmente, em respostas
hipersensíveis a esses antígenos, tendo o baixo consumo de ração como causa
primordial para essas alterações morfológicas.
Tabela
6.
Níveis nutricionais de rações pré-iniciais II (
Tabela
7. Níveis nutricionais de
rações iniciais I (
O baixo consumo
de alimento após o desmame afeta as exigências de nutrientes e energia. Em
geral, a exigência de energia do leitão para manutenção não é atendida até o
quinto dia após o desmame e o consumo calórico anterior ao desmame só é
atingido cerca de duas semanas após o desmame [13]. A exigência média em
energia metabolizável para atender as demandas de mantença na primeira semana
após a desmama (461 kj kg-0,75 ou 110 kcal kg-0,75) é maior
do que na quinta semana (418 kj kg-0,75 ou 100 kcal kg-0,75) o que pode
explicar a maior atividade do leitão para se adaptar às mudanças ambientais e
sociais após o desmame [3]. Assim, a alta demanda por energia para mantença e o
baixo consumo de alimento, verificados nessa fase, afetam a saúde e o
crescimento dos suínos. A seguir são apresentados alguns fatores que afetam o
consumo de alimento pelos leitões desmamados:
Para se
garantir um consumo adequado de nutrientes e energia, promovendo a manutenção
da integridade intestinal do leitão desmamado e, por conseqüência, reduzindo as
chances de ocorrência de diarréia, é imprescindível
que sejam tomadas as seguintes medidas:
Para manutenção
da qualidade nutricional das dietas dos leitões é imprescindível o controle
laboratorial e a redução da variabilidade na composição química das partidas de
um mesmo ingrediente. Essa variabilidade demanda seleção de fornecedores e
vigilância constante, através das análises químicas, físicas e biológicas, uma
vez que podem acarretar prejuízos para a saúde intestinal e perdas econômicas
importantes. Uma técnica conhecida há anos, mas ainda pouco utilizada, é a
microscopia dos alimentos. Através da observação dos ingredientes com o uso de
uma simples lupa, ou mesmo de um microscópio, podem-se verificar contaminações,
adulterações, qualidade do processamento e estimar a composição química do ingrediente.
Através da microscopia, pode-se facilmente verificar o grau de uniformidade das
partículas que compõem os ingredientes, que certamente afetam a digestibilidade dos ingredientes. Nas Figuras 1 e 2 são
apresentados detalhes microscópicos de duas farinhas de peixe, sendo uma de
alta qualidade (Figura 1 – farinha de peixe A) e outra de pior qualidade
(Figura 2 – farinha de peixe B). Nesta última, é possível observar a maior
quantidade de escamas, que pioram a digestibilidade e
o valor biológico do ingrediente.
Figura 1. Fotografia da farinha de peixe A (alta
qualidade).
Figura 2. Fotografia da farinha de peixe B (baixa qualidade).
Figura 3. Fotografia do plasma suíno spray dried.
Figura 4. Fotografia do leite em pó desnatado.
Por outro lado,
as Figuras 3 e 4 correspondem ao plasma spray dried e o leite em pó desnatado, respectivamente. Essas
figuras ressaltam a homogeneidade e o pequeno tamanho de partícula dos dois
ingredientes, o que explica a alta digestibilidadedesses
alimentos para os leitões. Detalhes e características dos
alimentos que
são de difícil identificação através
de análises químicas e físicas podem ser
facilmente observados com o uso da microscopia.
O plasma spray
dried, por exemplo, constitui-se em um
excelente ingrediente para promover rápido crescimento e adequada saúde
intestinal aos leitões. Alguns autores [7,31] realizaram revisões de literatura
sobre o uso desse ingrediente e concluíram que o consumo de ração é aumentado
em 21%, em média, quando comparado a dietas contendo derivados de soja, de
leite ou peixe. Entretanto, as grandes vantagens do plasma sobre o desempenho
dos animais não são atribuídas somente ao aumento no consumo de ração. Outros
autores [6,30], por exemplo, verificaram vantagens quando os suínos foram
criados em ambientes com maior carga patogênica do que em ambientes mais
limpos. A principal explicação para isso é a presença de quantidades
significativas de imunoglobulinas no plasma, constituindo-se em ferramenta
importante para reduzir a ocorrência de problemas sanitários como a circovirose suína e doenças associadas [23]. Coletivamente,
os resultados sugerem que as proteínas do plasma spray dried
reduzem a ligação, adesão e replicação dos microrganismos – interações
antígeno-anticorpo – facilitando a cicatrização de tecidos lesados e diminuindo
a resposta inflamatória local e sistêmica [28].
O
EXCESSO DE PROTEÍNA BRUTA COMO FATOR DE PREDISPOSIÇÃO A OCORRÊNCIA DE DIARRÉIAS
Após a ingestão
de colostro, quando imunoglobulinas intactas sofrem fagocitose e são
absorvidas, os animais passam a necessitar de aminoácidos e não mais de
proteínas. Os tempos de formulação de dietas com base no teor de proteína bruta
deveriam ter acabado quando se abandonou a formulação com base no Quadrado de
Pearson, quando a calculadora de quatro operações matemáticas foi substituída
pelo computador. Entretanto, mesmo atualmente, quando se recomenda a formulação
com base em aminoácidos digestíveis e energia líquida, ainda é comum encontrar
nutricionistas que não deixam de impor um nível mínimo de proteína bruta em
suas dietas. Esse fato faz com que a dieta tenha um teor maior de aminoácidos (nitrogênio)
do que o necessário. Essas dietas com elevado teor de proteína bruta
desempenham papel importante para o estabelecimento de diarréia pós-desmama por
E. coli [26]. Morés et
al. [20] observaram que dietas com 16% de proteína bruta, suplementadas com
lisina e 2% de ácido cítrico preveniram a ocorrência de diarréia pós desmama
por E. coli, com desmame dos
leitões realizado aos 35 dias de idade. O excesso de proteína no estômago
associado à imaturidade do sistema digestivo do leitão jovem promove a elevação
prolongada do pH gástrico acima de 3,0 o que pode
acarretar na proliferação exagerada de E. coli.
A redução da proteína bruta da dieta promove melhora na saúde intestinal
através da redução do pH e aumento da população de
lactobacilos no cólon proximal [24,34,35].
O
CONFLITO CUSTO X PRATICIDADE X QUALIDADE
A formulação de
dietas para leitões requer o uso de ingredientes palatáveis com alta
disponibilidade de nutrientes. Além disso, as dietas necessitam atender as
exigências nutricionais dos suínos.
Devido aos
problemas de disponibilidade de ingredientes de alta digestibilidade
e palatabilidade, problemas de logística e pressão
constante para produção de dietas de baixo custo para serem mais competitivas,
é comum observarem-se produtos para leitões que necessitam ser acrescidos de
milho e farelo de soja. Existem diferenças entre as escolas
norte-americana (dietas mais baratas) e européia (dietas mais complexas e que
estimulam a resposta imunológica), quanto aos padrões de nutrição dos leitões.
Exemplos das duas escolas podem ser observados também no Brasil.
Na Tabela 8 é
apresentado um exemplo prático com informações coletadas de um núcleo de 5% de
inclusão em dietas para suínos dos 45 aos 63 dias de idade. Como pode ser observado nesta tabela, a simplicidade deste tipo de formulação
busca atender à condição de falta de insumos nas propriedades rurais, como
por exemplo, o óleo de soja ou de aminoácidos industriais, constituindo-se em
um núcleo de baixo preço e que é mais atrativo do ponto de vista comercial.
Entretanto, os resultados de desempenho esperados não podem ser maximizados
devido à deficiência de energia (Dieta 1). A partir do mesmo núcleo foram
elaboradas quatro fórmulas alternativas de dietas que variaram em complexidade
e em composição química. Assim, conseguiu-se formular dietas com menor
percentual de farelo de soja e menor teor de proteína bruta que, embora possam
ser consideradas dietas simples em comparação a outros exemplos, permitem a
redução da ocorrência de diarréias e outros problemas nos leitões. Além disso,
estas dietas possibilitam uma melhor relação entre os aminoácidos e uma
transição mais amena para dietas contendo apenas farelo de soja como fonte
protéica principal.
O PAPEL
DO CÁLCIO E O ZINCO NA OCORRÊNCIA DE DIARRÉIA EM LEITÕES
O zinco (Zn),
quando adicionado na forma de óxido e em doses farmacológicas, por duas a três
semanas, promove o aumento do ganho de peso e reduz a
ocorrência de diarréia de leitões após o desmame [1,11,14,15,16]. Sabe-se que a
maior parte do Zn suplementado é eliminada nas fezes [8].
São vários os
mecanismos que o zinco exerce sobre o desenvolvimento de E. coli. O fornecimento de altas doses de óxido de zinco
aumenta a síntese de Ig A no intestino e reduz a translocação de bactérias tanto anaérobicas
como produtoras de ácido láctico nos linfonodos
mesentéricos [2]. Por outro lado, doses farmacológicas de zinco durante quinze
dias após o desmama aumentaram a expressão do gene do peptídeo antimicrobiano
PR-39 na medula óssea de leitões [33]. In vitro, o
óxido de zinco reduz a expressão de genes ligados a citocinas
antinflamatórias que são estimuladas por E. coli enterotóxicas.
O zinco também protege a integridade da membrana intestinal através da redução
da adesão e invasão de E. coli
enterotóxicas [29].
A absorção de
Zn ocorre, principalmente, no intestino delgado dos suínos, após esse mineral
se combinar especificamente com a prostaglandina E2
ou um de seus metabólitos no lúmen [19]. Vários componentes dietéticos podem
afetar a absorção desse mineral tais como níveis altos de cálcio (Ca), fósforo,
cobre, cádmio e cromo, além de fitato
e fibra [19].
Um estudo foi
realizado para avaliar se o efeito de altos níveis de Zn suplementar na dieta
sofre influência do nível dietético de Ca [18]. Nele, foram testados os efeitos
de níveis de Zn (0 e 2400 ppm),
na forma de óxido, em dietas contendo 0,80% (adequado) ou 1,20% de Ca. As
dietas experimentais foram fornecidas aos animais durante duas semanas, sendo
que nos 14 dias restantes do experimento todos os animais foram alimentados com
uma única dieta contendo 150 ppm
de Zn e 0,80% de Ca. Seis animais morreram por enterite, sendo que todos
receberam dietas sem Zn suplementar: dois do grupo alimentado com a dieta com
0,80% Ca e os demais com 1,20% Ca. A adição de Zn promoveu uma redução
significativa na freqüência de animais com diarréia. Observou-se que dietas
contendo maior nível de Ca ocasionaram maior ocorrência de diarréia nos
leitões. Considerando-se o período total de experimento, o consumo diário de
ração foi maior nos animais que receberam dietas contendo maior nível de Zn e
nível adequado de Ca. A suplementação das dietas com 2400 ppm de Zn promoveu um aumento no ganho diário de peso
dos leitões no período de suplementação e no período subsequente.
Ao contrário, o maior nível de Ca na dieta reduziu o ganho diário de peso dos
leitões nos primeiros 14 dias de experimento, talvez devido à redução da digestibilidade dos nutrientes resultante da elevação do pH e à formação de quelatos com
outros nutrientes no intestino. Verificou-se interação entre níveis de Zn e Ca
para o ganho diário de peso no período total de experimento, sendo que os
animais que não receberam Zn suplementar na dieta apresentaram respostas
similares, independente do nível de Ca dietético. Em contrapartida, os leitões
que consumiram dietas com 2400 ppm
de Zn apresentaram menor ganho diário de peso quando o nível de Ca foi de
1,20%. Isto demonstra que a ação do Zn é maior quando o nível de Ca na dieta é
adequado. Considerando-se o período total de experimentação, o uso de altos
níveis de Zn na dieta acarretou melhor conversão alimentar, ao passo que esta
variável não foi afetada pelo nível de Ca na dieta. Concluiu-se que a
suplementação de 2400 ppm de
Zn nas dietas de leitões após o desmame foi eficiente no controle da diarréia e
no aumento do consumo diário de ração e ganho diário de peso. Altos níveis de
Ca deprimem o desenvolvimento dos leitões, aumentando a ocorrência de diarréia
e reduzindo a ação benéfica de doses farmacológicas de Zn na dieta.
Tabela
8. Valores calculados de
dietas para suínos (45 aos 63 dias de idade) a partir de um núcleo comercial de
minerais e vitaminas com 5% de inclusão na fórmula
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
As diarréias
nos leitões podem acontecer devido a diversas causas, mas os nutrientes
presentes no intestino certamente possuem um papel importante para sua
ocorrência, desde a alteração da pressão osmótica na luz do intestino até como
fator importante para a modificação do equilíbrio da população microbiana. Este
trabalho foi preparado com o objetivo de enfatizar a importância de princípios
básicos de prevenção da sua ocorrência como, por exemplo, o controle dos
fatores de riscos até o emprego de conceitos básicos de formulação das dietas, como
redução dos níveis de proteína bruta e cálcio, por exemplo. Finalmente, a
diarréia é uma doença multifatorial e sua prevenção passa pelo controle de
variáveis ambientais que interagem com as outras, causando muitas vezes confundimentos difíceis de serem interpretados. Entretanto,
uma dieta formulada com cuidado e com ingredientes de alta digestibilidade
certamente auxilia em muito a evitar o problema.