Autor/s. : Mariana
Cruz Rossoni Serao, University of Illinois
at Urbana-Champaign, USA;
Juarez Lopes Donzele, Rita Flávia Miranda de
Oliveira, Aloízio Soares Ferreira, João Luís Kill e Lourdes Romão Apolônio, Centro de
Ciências Agrárias, Departamento de Zootecnia, Universidade Federal de Viçosa
(UFV),MG, eFrancisco Carlos de Oliveira Silva,
Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais -EPAMIG-, MG.
Sumário
Utilizaram-se
50 leitoas de alto potencial genético para deposição de carne magra na carcaça,
com peso inicial de 30,17 + 2,03, a fim de avaliar o efeito de níveis
crescentes de lisina digestível sobre o desempenho e características de
carcaça. Os animais foram distribuídos em delineamento experimental de blocos
ao acaso, com cinco tratamentos (0,83; 0,93; 1,03; 1,13 e 1,23% de lisina
digestível), cinco repetições e dois animais por unidade experimental. Na
distribuição dos animais dentro de cada bloco foi adotado como critério o peso
inicial dos animais. Não foi observado efeito dos níveis de lisina digestível
sobre o consumo de ração diário e ganho de peso diário. Observou-se efeito
quadrático dos tratamentos sobre a conversão alimentar, que melhorou até o
nível estimado de 1,11% de lisina digestível. Foi observado efeito linear dos
níveis de lisina sobre a taxa de deposição de proteína diária, entretanto, o
modelo Linear Response Plateau
foi o que melhor se ajustou aos dados e estimou o nível de 1,09% de lisina
digestível para melhor deposição de proteína diária. Não foi observado efeito
dos tratamentos sobre a taxa de deposição diária de gordura. Conclui-se que o
nível de 1,11% de lisina digestível proporciona os melhores resultados de
desempenho e de taxa de deposição de proteína diária na carcaça de fêmeas
suínas de alto potencial genético para deposição de carne magra na carcaça, dos
30 aos 60kg.
Palavras-chaves: aminoácido digestível, desempenho, exigência, fase de
crescimento
INTRODUÇÃO
A obtenção de
novas progênies de suínos tem sido feita pela seleção genética de animais com
alto potencial genético para deposição de carne magra na carcaça. Entretanto,
suínos provenientes de diferentes grupos genéticos não possuem a mesma
capacidade de conversão de alimento em proteína e podem exigir quantidades
distintas de nutrientes para alcançar seu máximo potencial genético. Assim,
suínos com alta taxa de ganho proteico exigem maior
consumo de aminoácidos, principalmente lisina, para exteriorizar todo o seu
potencial (BATISTA et al.,
2011).
A lisina tem
sido considerada o primeiro aminoácido limitante em rações para suínos à base
de milho e farelo de soja, e diretamente responsável pelo aumento na deposição
de músculo na carcaça (SILVA et
al., 2009). Assim, as melhores respostas de desempenho e de carcaça podem ser
associadas ao nível de lisina da ração.
Por outro
lado, tem-se observado que as exigências de suínos em crescimento,
principalmente de lisina, tem sido alterada (WARNANTS et al., 2003; KEIFER et
al., 2011). Esta variação pode ocorrer em razão do estádio fisiológico do
animal, do consumo ou as diferenças na composição da ração (KILL et al., 2003) e ainda podem ser
modificadas em razão do genótipo, sexo, idade, temperatura, saúde, densidade
populacional, entre outros fatores (NRC, 1998).
Diferenças na
capacidade de síntese de tecido magro foram observadas em linhagens com
diferente potencial para deposição de carne na carcaça (PUPA et al., 2001). Assim, suínos com
genótipos superiores exigem uma maior quantidade de proteína e aminoácidos na
ração para suportar alta taxa de deposição de proteína, consequentemente,
quanto maior a capacidade dos suínos de depositar carne magra na carcaça, maior
será a exigência diária de lisina para maximizar seu desempenho e a taxa de
deposição proteica (ROSSONI et al., 2009).
A taxa de
crescimento e o consumo maior têm sido observados em machos castrados quando
comparados com fêmeas suínas. No entanto, estas possuem melhor eficiência na
conversão de alimento em peso. O aumento na deposição de tecido magro associado
ao menor consumo diário de ração pode resultar, nas fêmeas suínas, em maior
exigência de aminoácidos essenciais em relação aos machos castrados. Assim,
objetivou-se com este trabalho avaliar o efeito de níveis crescentes de lisina
digestível sobre o desempenho e características de carcaça de fêmeas suínas com
alto potencial genético para deposição de tecido magro na carcaça dos 30 aos 60kg.
MATERIAL
E MÉTODOS
O experimento
foi conduzido no galpão experimental da granja de suínos da Empresa de Pesquisa
Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG), localizado na Fazenda Experimental Vale
do Piranga, município de Oratórios, MG.
Foram
utilizadas 50 leitoas, híbridas comerciais, de alto potencial
genético para deposição de carne magra na carcaça, com peso inicial de 30,17 +
2,03, distribuídas em delineamento experimental de blocos ao acaso, com cinco
tratamentos (níveis de lisina digestível), cinco repetições e dois
animais por unidade experimental. Na distribuição dos animais dentro de cada
bloco foi adotado como critério o peso dos animais.
Os animais
foram alojados em baias equipadas com comedouros semi
automáticos e bebedouros tipo chupeta, com piso de concreto e cobertura
de telha de cimento amianto. Foi utilizado um termômetro de máxima e mínima,
colocado no interior do galpão, para registro diário da temperatura.
As rações
experimentais foram formuladas à base de milho e farelo de soja, suplementadas
com minerais e vitaminas, para atender as exigências nutricionais dos animais
de acordo com Rostagno et al. (2000), exceto para proteína bruta e
aminoácidos. Os tratamentos corresponderam a uma ração basal com 18,59% de PB e
3.218kcal de EM/kg, suplementadas com L-lisina HCl, o que resultou em rações com 0,83; 0,93; 1,03;
1,13 e 1,23% de lisina digestível. As rações foram suplementadas com níveis
crescentes de aminoácidos industriais resultando em rações com relações aminoacídicas entre lisina e os demais aminoácidos essenciais
estabelecidas, com base na digestibilidade
verdadeira, sendo as relações aminoacídicas das
rações atendidas de acordo com aquelas preconizadas por Rostagno
et al. (2000) para proteína
ideal. As composições centesimais e determinadas das dietas são apresentadas na
Tabela 1. O fornecimento das dietas experimentais e de água aos animais durante
todo período experimental foi à vontade.
Para
determinação do ganho de peso, consumo de ração, conversão alimentar e do
consumo de lisina foram feitas pesagens semanais das rações e respectivas
sobras e dos animais, no início e no final do experimento. Ao final do
experimento, quando atingiram o peso de 60,94 ±1,76kg, um animal de cada
unidade experimental com peso mais próximo da média de peso dos animais do
bloco, foi utilizado para avaliar a composição química e as deposições de
proteína e gordura na carcaça. Após jejum de 24 horas, os animais foram
abatidos por sangramento, depilados com lança-chamas e faca, eviscerados, e as
carcaças inteiras, incluindo cabeça e pés, foram pesadas.
Posteriormente,
a meia carcaça direita foi triturada por 20 minutos, em cutter
comercial de 30 HP e 1.775rpm.
Após homogeneização, amostras foram obtidas para posteriores análises, conforme
metodologia descrita por Moreira et
al. (2005) e armazenadas a - 12°C. Um grupo adicional de cinco animais do mesmo
lote e peso inicial foi abatido no início do experimento para determinação da
composição inicial das carcaças dos suínos.
As análises
dos ingredientes, das rações e das carcaças foram realizadas no Laboratório de
Nutrição Animal do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa,
de acordo com as técnicas descritas por Silva (2002).
Os parâmetros
avaliados foram: ganho de peso médio diário, consumo de ração médio diário,
conversão alimentar, consumo de lisina médio diário, taxa de deposição de
proteína e de deposição de gordura nas carcaças.
Os dados
observados foram submetidos à análise de variância, com a utilização do Sistema
de Análise Estatística e Genética – SAEG (UFV, 2005). As estimativas de
exigência de lisina digestível foram obtidas por meio de análises de regressão
linear, quadrática e ou descontínuo "Linear Response
Plateau" (LRP), conforme o melhor ajustamento
obtido para cada variável.
Tabela 1. Composição centesimal
e determinada das dietas experimentais
RESULTADOS
E DISCUSSÃO
As
temperaturas médias, mínima e máxima, verificadas no período foram,
respectivamente, 25,4 ± 1,33°C e 29,1 ± 1,76°C. Ao se considerar que a faixa
ideal de temperatura para suínos na fase de crescimento sugerida por Coffey et
al. (2000) está entre 16 e 24ºC para melhor desempenho produtivo e qualidade de
carcaça, constatou-se, com base na variação da temperatura ocorrida na condução
do experimento, que os animais foram submetidos a períodos de estresse térmico.
Nos resultados
de consumo de ração diário (CDR), ganho de peso diário (GPD) e da conversão
alimentar (CA) de leitoas de alto potencial genético para deposição de carne na
carcaça, consumindo rações com diferentes níveis de lisina digestível, dos 30 a
60kg, apresentados na Tabela 2, não foi observado
efeito (P>0,05) dos níveis de lisina sobre o consumo de ração. Do mesmo
modo, Souza (1997), Fontes et
al. (2000) e Kill (2002), também não encontraram
efeito dos níveis de lisina sobre o CRD de leitoas dos 30 aos 60kg. Mais
recentemente, Abreu et al.
(2007), ao trabalharem com leitões machos castrados, dos 30 aos 60kg, também
não encontraram variação significativa no consumo voluntário de alimento quando
os níveis de lisina digestível variaram de 0,80 a 1,10%.
Tabela 2. Desempenho carcaça de fêmeas suínas recebendo diferentes
níveis de lisina digestível dos 30 aos 60 kg
Por outro
lado, Fontes et al. (2005) e
Fernández-Figares et al.
(2007), constataram redução no CRD de leitoas na fase de crescimento à medida
que se elevou a concentração de lisina digestível na ração.
Os resultados
de CRD obtidos confirmam a proposição de Edmonds e
Baker (1987), de que os suínos são capazes de tolerar consideráveis excessos de
aminoácidos sem alteração na ingestão voluntária de alimento.
Outro fator
que pode ter contribuído para que não ocorresse variação no CRD foi a utilização do conceito da proteína ideal na formulação das
rações nos diferentes tratamentos. De acordo Kill
(2002), suínos alimentados com rações formuladas, nas quais foram mantidas as
relações entre aminoácidos essenciais com a lisina, são
menos susceptíveis a variações no consumo alimentar.
O ganho de
peso diário (GPD) não foi influenciado (P>0,05) pelos níveis de lisina
digestível das rações. De forma semelhante, Fontes et al. (2000), Kill (2002),
Fontes et al. (2005) e Abreu et
al. (2007), também não observaram variação significativa dos níveis de lisina
sobre o GPD dos animais. Em contrapartida, Oliveira et al. (2009) observaram aumento linear sobre a taxa
de crescimento de suínos machos castrados dos 30 aos 60kg quando avaliaram
níveis entre 0,7 e 1,10% de lisina digestível, enquanto James et al. (2002) e Colina et al.
(2003) observaram influência positiva dos níveis de lisina sobre a eficiência
de utilização do alimento para ganho de peso em suínos na fase inicial.
As diferenças
de respostas dos suínos aos níveis de lisina observadas
entre os trabalhos, provavelmente reflete diferenças na capacidade genética
para deposição de proteína, bem como da fase de crescimento dos animais
utilizados nos diferentes estudos.
Embora não
tenha ocorrido efeito significativo dos tratamentos sobre o ganho de peso dos
animais, constatouse uma melhora de 8,5% no valor
absoluto do GPD quando o nível de lisina digestível da ração aumentou de 0,83
(1.046g) para 1,03% (1.135g).
O consumo
diário de lisina (CDL) aumentou (P<0,001) de forma
linear à medida que se elevou o nível de lisina digestível da ração segundo a
equação Y= 0,8863 + 20,4811X (r2 = 0,72). O fato do CRD não ter variado entre
os tratamentos justifica a relação linear positiva observada entre o consumo de
lisina e o seu nível na ração. Relação positiva entre o consumo de lisina com a
sua concentração na dieta também foi observado por Fontes et al. (2000), Fontes et
al. (2005) e Abreu et al. (2007).
Os níveis de
lisina ração na influenciaram (P<0,02) a conversão alimentar (CA), que
melhorou de forma quadrática até o nível estimado de 1,11% (Figura 1),
correspondente a um consumo de lisina diário de 23,62g.
Figura 1. Efeito do nível de
lisina digestível sobre a conversão alimentar de leitoas de 30 a 60kg
Os resultados
estão de acordo com as recomendações de Fontes et al. (2000) e Rostagno et al. (2005), tanto para CA como para CDL. No entanto,
resultados inferiores foram observados por Kill
(2002), que obtiveram melhores respostas de CA no nível de 0,98% de lisina
digestível para leitoas na fase de crescimento. Do mesmo modo, a recomendação
para suínos na fase de crescimento recomendado pelo NRC (1998) de 0,83% de
lisina digestível, também está abaixo do resultado do presente trabalho.
A variação na
conversão alimentar, entre os diferentes trabalhos, pode ser atribuída
ao nível de lisina utilizada nas dietas experimentais, ao sexo, à fase de
crescimento e ao potencial genético dos animais. Segundo Santos et al. (2011), animais de alto potencial
genético são eficientes na utilização do alimento para deposição de carne magra
e respondem de forma quadrática ao aumento no nível de lisina das dietas.
Com os
resultados de CA e GPD, podese deduzir que a
exigência de lisina digestível para máxima eficiência de utilização de alimento
para ganho é maior que a exigência para melhores resultados de GPD. Este padrão
de resposta foi similar àquelas observadas por Fontes et al. (2000) e Abreu et
al. (2007). A melhora verificada na CA entre os níveis de 0,83 a 1,03% de
lisina digestível seria um indicativo de que, provavelmente, a composição do
ganho tenha sido alterada, aumentado proporcionalmente a deposição de proteína
em relação à de gordura. Embora, de acordo com Chen et al. (1999) a deposição de proteína possa resultar
em menor eficiência energética de ganho, Hahn et al. (1995) sugeriram que a alteração na composição do
ganho, ao favorecer a deposição de proteína resulta na melhora da eficiência de
utilização do alimento por unidade de ganho de peso, pelo fato de que, na
deposição de tecido proteico, ocorre,
simultaneamente, maior deposição de água, contrariamente à deposição de tecido
adiposo.
Os resultados
de taxa de deposição de proteína (TDP) e de gordura (TDG) na carcaça de leitoas
de alto potencial genético para deposição de carne na carcaça, dos 30 a 60kg, encontram-se na Tabela 3, onde é observado efeito
(P<0,05) dos níveis de lisina sobre a taxa de deposição de proteína diária,
que aumentou de forma linear (Figura 2). No entanto, o modelo Linear Response Plateau (LRP) foi o que
melhor se ajustou aos dados, estimando em 1,09% o nível de lisina a partir do
qual os dados permaneceram em um platô. Neste nível de lisina os animais
apresentaram um consumo estimado de 23,22g/dia de lisina digestível.
A exigência de
lisina digestível de 23,22g para maximizar a deposição de proteína na carcaça
dos animais neste estudo, ficou acima daquele de 17,91g obtidos por Fontes et al. (2005), ao trabalharem com
fêmeas de alto potencial genético, dos 30 aos 60kg.
Uma das
hipóteses para esta resposta é de que ao nível de 1,09% de lisina digestível, a
exigência dos animais para este aminoácido alcançou o potencial máximo de
deposição de proteínas. Conforme Abreu et
al. (2007), quando a energia da ração não é fator limitante, os suínos
respondem a aumentos dos níveis de lisina da ração até o ponto de máxima
deposição de proteína na carcaça, determinado pela genética. Assim, a deposição
de tecido muscular com o consumo de energia só é eficientemente obtida se o
aporte de aminoácidos, principalmente lisina, for suficiente para permitir a
expressão genética do animal (MAIN et
al., 2008). Dessa forma, suínos com altas taxas de deposição de proteína têm
exigências mais altas de aminoácidos para expressar seu potencial genético de
crescimento e eficiência para deposição de tecido muscular.
Tabela 3. Desempenho e características de carcaça de fêmeas suínas
recebendo diferentes níveis de lisina digestível dos 30 aos 60kg
Figura 2. Efeito do nível de lisina digestível sobre a taxa de
deposição de proteína de leitoas de 30 a 60kg
A resposta da
TDP se assemelha com o nível de 1,11% de lisina digestível estimado para melhor
CA. Estes resultados, aliados ao fato de não ter ocorrido
efeito significativo sobre o GPD, podem ser indicativos de um aumento no nível
de IGF-1 circulante, que é um hormônio ligado à deposição de proteína muscular,
nos tratamentos com níveis mais elevados de lisina, o que resulta em maior
deposição de proteína diária. Ren et al. (2007), ao avaliarem níveis
de lisina na ração de suínos machos castrados, observaram interação
significativa do aumento IGF- 1 no plasma com o aumento da retenção de
nitrogênio diária, quando os animais receberam níveis elevados de lisina na
ração.
Ao estudarem
fêmeas suínas que recebiam dietas com 72% de redução do nível de lisina, Ferández-Figares et
al. (2007) observaram redução significativa da concentração de IGF-1 plasmática
associada a menores taxas de retenção de nitrogênio dos animais que receberam a
ração com deficiência de lisina quando comparados com os do grupo controle. Do
mesmo modo, Katsumata et al. (2002) também observaram redução na
concentração de IGF-1 no plasma de suínos alimentados com dietas que continham
61% de deficiência de lisina na ração.
A deposição de
gordura na carcaça dos animais não foi influenciada (P>0,05) pelos níveis de
lisina da ração. Este resultado foi semelhante ao obtido por Fontes et al. (2000) e Abreu et al. (2007) e difere dos de Fontes et
al. (2005), que encontraram um efeito quadrático (P<0,02) do nível de lisina
na ração sobre a deposição de gordura, que diminuiu até o nível estimado de
1,09% de lisina total.
Assim, pode-se
concluir que o nível de 1,11% de lisina digestível, correspondente a um consumo
de 23,62g/dia de lisina digestível, proporciona os melhores resultados de
desempenho e de taxa de deposição de proteína diária em fêmeas suínas de alto
potencial genético para deposição de carne magra na carcaça, dos 30 aos 60kg.