Vírus da Diarréia Epidêmica dos Suínos
Introdução
O Vírus da Diarréia Epidêmica
dos Suínos (PEDv) vem causando prejuízos incalculáveis
à produção de suínos em diversos países do Continente Americano, modificando o
comportamento do mercado de suinocultura em nível mundial.
A primeira ocorrência deste
vírus foi em 1971 na Inglaterra, sendo incialmente
denominado vírus similar da Gastroenterite
Transmissível (TGEv), que
causava alta mortalidade em leitões em diferentes fases de produção. Em 1977
foi dissociado do vírus da TGE, e então passou a ser chamado de PEDv (Wood, 1977). Desde então, o vírus foi identificado na
República Checa, Húngria, Corea,
Filipinas, China, Itália Tailândia, Alemanha, Espanha e Japão (Pospischil et
al., 2002 & Song and
Park, 2012).
Somente em meados de março de
2013, este mesmo vírus ressurgiu nos Estados Unidos, e em poucos meses já
atingiu 80% da suinocultura americana. Os primeiros estados americanos
acometidos foram os de Iowa e Indiana, e logo em
seguida mais estados indicaram a presença da doença, chegando ao total de 25
estados acometidos (Figura 1). Desde então, este vírus vem se espalhando de
maneira devastadora em diversos países do continente americano, europeu e
asiático. Os principais países acometidos até o momento são o México e Peru no
2º semestre de 2013, Japão em Outubro de 2013, Canadá em Janeiro de 2014,
Colômbia em Março de 2014, (Figura 2).
Figura 1. Número de
estados americanos acometidos pela PEDv em março de
2014.
Figura 2. Número de
estados americanos acometidos pela PEDv em março de
2014.
Apesar de ser um vírus
extremamente contagioso, é também espécie-específico,
e, portanto; não apresenta risco algum para outras espécies animais, bem como
para humanos, não sendo classificado como uma zoonose.
Estimativas indicam que as
perdas ocorridas nos Estados Unidos já atingiram a casa dos 3 milhões de suínos
prontos para o abate. Dados fornecidos pelo Rabobank,
no primeiro trimestre de 2014, demonstraram que até setembro de 2014 poderá
haver uma redução de 27% na quantidade de cevados disponíveis nos EUA, Canadá e
México (Figura 3).
Uma estratégia que os produtores
estão realizando em função desta redução de disponibilidade de animais é o
aumento do peso de abate daqueles que sobrevivem para que haja uma maior oferta
de carne no mercado.
Figura 3. Estimativa
realizada pela AASV e Rabobank de falta de cevados no
mercado americano, canadense e mexicano ao longo de 2014 e 2015.
Características
do Vírus
O vírus
da diarreia epidêmica dos suínos (PEDv)
é um Coronavirus (Figura
4), da famíliaCoronaviridae,
causador de lesões nas vilosidades intestinais, levando à atrofia, e, consequentemente, à má absorção dos nutrientes ingeridos.
Como já comentado acima, este vírus infecta somente suínos, não tendo
importância em Saúde Pública.
O Vírus da PED é um RNA envelopado,
de cadeia única (monocatenário) de polaridade
positiva, o que faz com que ele seja prontamente traduzido por robossomos e assim agindo como um RNA mensageiro (McOrist, 2013). Talvez essa seja uma das explicações de sua
rápida disseminação.
Segundo Pospischil
et al. (2002) o PEDv possui
uma boa estabilidade em pH variável, em média de 5 a 9, sendo bastante
resistente, e, portanto, não sendo o pH uma boa metodologia para inativá-lo. Em temperatura ambiente pode sobreviver até 2
semanas, pode ser inativado em temperatura de 60 ºC
por 30 minutos, sendo, portanto, bem resistente. Além disso, possui 4 proteínas
estruturais codificantes apresentadas na figura
abaixo (Figura 4):
- Spike (S);
- Membrana (M);
- Envelope (E);
- Nucleocapsídeo
(N).
Segundo
informações de pesquisas realizadas, há uma semelhança gênica de 99,5% entre as
3 primeiras diferentes estirpes/sorotipos do Coronavirus americano
com o vírus asiático do ano de 2012 presentes no banco genético – National
Center for Biotechnology Information -NCBI –GenBank (Bi et al., 2012). Além desta semelhança os autores desta
pesquisa (Huang et al, 2013) observaram linhagens distintas entre esses 3
sorotipos, o que segundo eles, certamente houve alguma introdução do vírus
asiático no continente americano e a partir daí houve a ocorrência de
sucessivas recombinações gênicas ao longo do tempo e que deram origem a estas
novas formas do vírus. Entretanto, de uma maneira geral há uma grande
discussão, pois os animais introduzidos ao EUA são oriundos do Canadá, e
segundo informações o último lote de animais importados foi negativo ao vírus e
não apresentam sintomatologia alguma. Portanto, há uma grande suspeita de que o
vírus deva ter sido carreado por alguma outra forma que não pelo transporte de
animais infectados.
Figura 4. Figura
representativa do Vírus da PEDv.
Epidemiologia
Segundo dados de Goede et
al. (2014) até o presente momento há um total de 680 granjas de suínos já
positivas para a PEDv nos Estados Unidos, totalizando 2.300 milhões de
matrizes, o que representa 40% da população de suínos positivas para a PEDv.
Atipicamente este é um vírus de
rápida disseminação, apresentando um período de 12 a 36 horas em infecções
experimentais (Kim et al.,
2000), sendo sua presença detectada em conteúdo intestinal em 12 horas após a
infecção (Linhares, 2014a).
De acordo com a literatura,
depois de infectado o animal permanece excretando o vírus para o ambiente em
média de 7 a 10 dias. Entretanto, segundo pesquisas recentes, esta excreção tem
ocorrido em média de 21 a 30 dias, e caso o animal apresente uma reinfecção ele voltará a excretar vírus pelas fezes por
mais 20 a 30 dias ambas as excreções em alta
concentração viral (Yoon et
al., 2014).
Segundo dados obtidos de
diversas granjas nos EUA no momento em que a fêmea se infecta, ela leva de 4 a
5 semanas para criar uma resposta imune contra o PEDv.
Durante este período, há um alto percentual de mortalidade, chegando a 100%, e
após este período as fêmeas passam a transferir esta imunidade via leite, e
então, contribuindo positivamente para a redução gradativa da ocorrência de mortalidade
até voltar a patamares zootecnicamente aceitos (Gráfico 1).
Gráfico 1.
Distribuição do percentual de mortalidade após a introdução da PEDv na semana 0 e o comportamento deste percentual com o
passar das semanas.
Formas
de transmissão
A
excreção do vírus ocorre através das fezes, sendo esta a principal fonte de
infecção. A quantidade do vírus para se tornar infectante é muito baixa quando
comparada a outros vírus, sendo que a concentração média de dose infectante
para leitões é de 105 a
108 vírus.
Esta característica associada a sua alta resistência às temperaturas mais
adversas fazem com que o vírus se torne facilmente infectante.
Um
grande número de partículas virais pode ser transmitido através de um volume
muito pequeno de fezes, sendo que cada ml de fezes pode conter de 1011 a 1013 vírus.
As formas de infecção ainda não
estão muito bem elucidadas, entretanto segundo dados de Schwartz & Main (2013) há uma gama de diferentes possibilidades de
transmissão indireta, como caminhões, instalações de frigoríficos, pessoas, ar,
pássaros, ração e diversos fômites, mostrando o vasto
potencial de transmissão deste agente. Ainda estão sendo feitos estudos no
intuito de elucidarem ao certo qual dessas formas seria a mais importante.
Patogenia
O Coronavirus possui
causa, principalmente, danos nos enterócitos maduros
presentes nas vilosidades intestinais ao longo de todas as porções do intestino
delgado (ID), provocando severa atrofia nas suas vilosidades, sendo raramente
identificados em colonócitos (células do cólon
– intestino grosso – IG). O vírus da PED não foi identificado fora
do TGI, como nos pulmões, linfonodos mesentéricos.
Assim sendo não apresentam importância como agente de problemas respiratórios.
O período de incubação da PEDv é em média de 12 a 18 horas. Os primeiros sinais de diarreia ocorrem geralmente de 24 a 36 horas após a
infecção.
Sinais
Clínicos
Este vírus é semelhante ao vírus
da Gastroenterite Transmissível (TGE), entretanto
possui diferenças antigênicas. Animais acometidos pela PEDv
apresentam os seguintes sinais clínicos (Figura 5):
- Anorexia;
- Diarreia
aquosa severa e amarelada em leitões de todas as idades, principalmente em
leitões de 1 a 4 semanas de vida;
- Quadros de Vômitos;
- Desidratação intensa;
- Alta mortalidade –
praticamente 100% de mortalidade em leitões lactentes.
Lesões
As lesões macroscópicas
presentes em quadros da PEDv não são patognomônicas, entretanto através da realização de
necropsia é possível observar, ao abrir a cavidade abdominal, a presença de
grande quantidade de líquido no interior das alças intestinais, demonstrando a
presença de conteúdo líquido, característica marcante da PEDv (Figura 6).
Figura 6. Presença
de grande quantidade de líquido nas alças intestinais (ID) e consistência
aquosa da diarreia em amostra de fezes coletada.
As lesões microscópicas
observadas na Histopatologia nos demonstram uma
atrofia severa de vilosidades intestinais, o que faz com que a absorção de
nutrientes fique prejudicada ou até mesmo completamente impedida (Figura 7).
Figura 7. Cortes
histológicos mostrando vilosidades intestinais íntegras (à esquerda) e severa
atrofia das vilosidades intestinais (à direita) de leitões infectados após 36
horas pelo vírus da PED.
Diagnóstico
O diagnóstico deve ser realizado
levando em consideração a epidemiologia, os sinais clínicos, como o
aparecimento súbito de diarreia associada a uma alta
mortalidade (de 40 a 60%). Além disso, deve-se levar em consideração análise
histopatológica bem como análises laboratoriais. As análises disponíveis hoje
são PCR (diversos tipos), histopatologia, e provas
rápidas de campo (imunocromatografia) e sorologia
(Kit sorológico – Minnesota). Há também a possibilidade de realizar
testes de imunohistoquimica, microscopia eletrônica,
entretanto ambas as técnicas possuem algumas limitações.
No campo
ou no laboratório pode ser extraído o RNA a partir de suspensões frescas de
conteúdo intestinal com kits comerciais. Já existe kit de detecção rápida do
vírus da PED, representado peloAnigen Rapid PED Ag Test Kit (Bionote®). Este kit pode
ser levado para a propriedade e a análise e resultado podem
ser observados in loco, não havendo necessidade de encaminhar ao
laboratório.
Segundo Schwartz & Main (2013), apenas 10 mL de fezes ou conteúdo intestinal
de leitões com sintomatologia aguda, dentro das primeiras 24 horas após o
início da diarreia são suficientes para confirmar o
diagnóstico de PEDv por PCR. Além da amostra de fezes,
há possibilidade de diagnóstico do vírus PED através de fluidos orais e ração.
Os
diferentes tipos Coronavirus são muitas vezes difíceis de cultivar
e o PEDv não é uma exceção, uma vez que a maioria das
tentativas realizadas a partir de material de campo apresentaram pouco êxito.
Formas
de Prevenção
Em países com diagnóstico
positivo para o PEDv, as autoridades veterinárias
estão solicitando aos produtores que sejam mais vigilantes com o transporte dos
animais, roupas usadas pelos funcionários da granja e qualquer objeto que possa
ter entrado em contato com o vírus. Há necessidade de muita cautela e cumprir
todos os protocolos de biossegurança.
Em granjas positivas, um dos
manejos que estão praticando é o de desmamar todos os leitões, a fim de evitar
alto percentual de mortalidade na fase de maternidade. Além disso, estão
expondo as leitoas/marrãs ao vírus, para que após 4 a 5 semanas elas passem a
produzir anticorpos (Ac)
contra o PEDv, e assim estando imunologicamente preparadas para passar esses Ac a seus leitões na fase de lactação.
Um ponto bem debatido e que deve
se muito bem seguido para evitarmos a entrada do PEDv
no Brasil, é a execução dos protocolos de Biossegurança
descritos abaixo:
- Monitoramento de Importação de
material genético – testar animais na origem e no destino –
Quarentenário protegido e com testes de diagnóstico eficazes;
- Limpar e desinfetar caminhões
de transporte de animais;
- Evitar entrada de pessoas e/ou
equipamentos;
- Ações durante a Copa –
efetuar uma fiscalização rígida pela ANVISA;
- Fechar as granjas para
visitação de pessoas estrangeiras, independentemente do país de origem;
- Suspender a importação de
matérias primas de origem animal – não mais utilizadas, ou caso haja
necessidade de utilizar, realizar análise por PCR para verificar a presença ou
não do vírus;
- Utilizar roupas descartáveis;
- Limpar e desinfetar as botas
e/ou utilizar Propé;
- Realizar todos os manejos
básicos de granja com muita seriedade:
Manejo de Colostro;
Todos dentro todos fora;
Limpeza e desinfecção muito bem
realizada.
Controle de vetores –
roedores, moscas, pássaros;
- Utilizar desinfetantes com
comprovada ação viricida.
Segundo
trabalho desenvolvido por Pospischil et al. (2002), na tabela abaixo
estão descritos os desinfetantes que possuem uma ação efetiva contra o PEDv.
Tabela
1.
Desinfetantes com ação efetiva contra o vírus da PED
Considerações
finais
Este é um momento muito delicado
e que requer muita seriedade, profissionalismo e união, para que juntos
possamos evitar a entrada deste agente em território brasileiro. Portanto,
seguindo à risca todos os protocolos e processos de Biossegurança,
certamente, teremos êxito em nos mantermos como país livre do vírus da PED.
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Por
Andrea Panzardi, Supervisora Técnica Aves &
Suínos – Região Sudeste
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