Avaliação técnico-econômica de suínos machos imuno e
cirurgicamente castrados
Autor/s. : Heloisa Vasquez Bruno, Programa de
Pós-graduação em Ciência Animal, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
(UFMS), MS; Charles Kiefer,
Ricardo Carneiro Brumatti, Alexandre Pereira dos Santos e Gabriela Puhl
Rodrigues, UFMS, MS, e Gabriel
Cipriano Rocha, Programa de Pós-graduação em Zootecnia, Universidade
Federal de Viçosa (UFV), MG.
RESUMO
Realizou-se este estudo com o objetivo de avaliar o desempenho
técnico-econômico e determinar a lucratividade, por meio da análise de
sensibilidade econômica, de suínos machos imuno (IM) e cirurgicamente castrados
(MC). Foram realizados dois experimentos, em delineamento inteiramente
casualizado, composto por dois tratamentos (IM e MC), com oito repetições de 10
animais cada, totalizando 160 suínos por experimento. Verifi cou-se que suínos
IM apresentam menor consumo de ração e melhor conversão alimentar nas fases de
crescimento em relação aos MC. Na fase de terminação, suínos IM apresentam
melhor ganho de peso, conversão alimentar, rendimento de carcaça e porcentagem
de carne em relação aos MC. A utilização de IM aumenta a lucratividade na
produção de suínos. A análise de lucratividade entre suínos IM e MC deve
considerar todas as fases de criação, uma vez que o desempenho diferencial dos
suínos não castrados na fase de crescimento infl uencia economicamente os
resultados da produção.
Palavras-chave: análise de sensibilidade, carcaça,
imunocastração,lucro.
INTRODUÇÃO
Suínos machos não castrados apresentam melhor conversão alimentar
e carcaças com maior percentual de carne do que os MC (BONNEAU, 1998), porém a
castração é necessária, devido às altas concentrações de androsterona e escatol
acumuladas na gordura subcutânea e intramuscular de machos não castrados
(PATTERSON, 1968). A imunocastração induz a formação de anticorpos contra o
hormônio liberador de gonadotropina (GnRH), que se ligam ao GnRH endógeno,
bloqueando o estímulo à secreção do hormônio folículo estimulante (FSH) e do
hormônio luteinizante (LH), causando redução da secreção de esteroides
testiculares, incluindo androsterona (ZAMARATSKAIA et al., 2008). Esse fato
possibilita a produção de carcaças isentas de odores sexuais (JAROS et al.,
2005). Suínos castrados imunologicamente apresentam melhor eficiência alimentar
e carcaças com maior percentual de carne que suínos MC (PAULY et al., 2009).
Também se observa a redução da frequência de montas e do comportamento
agressivo dos IM, quando comparados aos não castrados (RYDHMER et al., 2010).
Nesse sentido, atendendo ao crescente interesse mundial em torno do
bem-estar animal, a imunocastração pode reduzir o sofrimento e estresse
causados pela castração cirúrgica.
Em vista dos benefícios que a imunocastração pode oferecer à
suinocultura, realizou-se este estudo com o objetivo de avaliar o desempenho
técnico-econômico e determinar a lucratividade, por meio da análise de
sensibilidade econômica, de suínos IM e MC.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram realizados dois experimentos com suínos IM e MC, da mesma
linhagem. No experimento I, foram utilizados 160 suínos (80 IM e 80 MC),
avaliados dos 95,8±5,5kg aos 122,9±5,1kg, com período experimental de 30 dias.
No experimento II, foram utilizados 160 suínos (80 IM e 80 MC), avaliados dos
27,5±1,0kg aos 114,5±6,3kg, com período experimental de 98 dias. Em cada
experimento, os animais foram distribuídos em delineamento experimental
inteiramente casualizado, com doistratamentos (IM e MC), com dez repetições e
oito animais cada. As dietas experimentais foram elaboradas de acordo com as recomendações
de ROSTAGNO et al. (2005) e fornecidas à vontade aos animais.
Os suínos MC foram submetidos à orquiectomia até o sétimo dia de
vida. Para a obtenção dos IM, os machos receberam duas doses de vacina
anti-GnRH, via subcutânea, 60 e 30 dias pré-abate.
As variáveis avaliadas foram o desempenho (peso fi nal, consumo de
ração, ganho de peso e conversão alimentar) e as características de carcaça
(peso e rendimento de carcaça e percentual de carne). Para a avaliação
econômica, as variáveis utilizadas foram o custo das dietas (R$ kg-1), custo da
imunocastração, preço do suíno vivo (R$ kg-1), receita de bonifi caçã o (R$) e
lucro bruto (R$). As equações de custo da dieta foram: Custo da dieta (R$
Dieta) = (Consumo)*(R$ kg-1 da dieta)*(Período).
O preço comercial estabelecido para a dose da vacina foi de R$
5,00. Considerando que são necessárias duas doses por animal, o custo da
imunocastração foi de R$ 10,00 por cabeça. O custo total (CT) foi calculado
pela fórmula: CT=(R$ Dieta)+(Custo da Imunocastração). Para a obtenção da
receita pelo sistema de bonifi cação (BF), foi utilizada a equação proposta por
GUIDONI (2000): Receita BF= R$/PV-1*[(PCarc/%Rend)*(23,6+0,2 86*PCarc+%CarnM)],
onde: R$ PV-1= preço pago por quilograma de suíno; PCarc= peso de carcaça; %Rend=
percentual de rendimento de carcaça e %CarnM= percentual de carne da carcaça. A
diferença entre receitas e custos resultou no lucro bruto de cada sistema,
considerado o cenário padrão do mercado. Não foram computados os demais custos
de produção por serem considerados similares para a produção de suínos IM e MC.
A diferença entre suínos IM e MC foi obtida por intermédio da fórmula:
Diferença (IM-MC) = Lucro bruto IM – Lucro bruto MC. A diferença
percentual foi obtida através da fórmula: Diferença % (IM-MC) = Diferença
(IMMC)/ Lucro bruto MC.
Após a determinação dos resultados das equações, realizou-se a
análise de sensibilidade, pressupondo a construção de três cenários: mais
provável (M); otimista (O); pessimista (P) e denominada análise MOP (GITMAN,
2000). Esses cenários foram idealizados de acordo com a oscilação do custo da
dieta, receita obtida com a bonifi cação de carcaça e custo da vacina. A
variação utilizada no custo da dieta foi de 10%, valor estabelecido de acordo
com a média variação de preços dos principais ingredientes das dietas (milho e
farelo de soja) durante o ano de 2011, obtida do indicador de preços CEPEA
(2011).
A variação na receita de bonifi cação foi obtida através da média
dos indicadores de preços do suíno (2,40 R$ kg-1), pago ao produtor no decorrer
de 2011, em SP, MG, SC e RS, sendo observada uma variação média de 19% (CEPEA,
2011). Para composição da variação de custos no valor da vacina, optou-se por
uma oscilação de 10% no preço. O cenário mais provável refl ete o cenário padrão
da produção em 2011. Para o cenário pessimista, foi utilizado aumento no custo
de alimentação de 10%, queda na receita de bonifi cação de 19% e aumento do
custo da imunocastração de 10%, em relação ao cenário mais provável. No cenário
otimista, aplicou-se um decréscimo de 10% no custo de alimentação e aumento de
19% na receita de bonifi cação e decréscimo no custo da imunocastração de 10%
(Tabela 1).
Os dados zootécnicos foram submetidosà análise de variância,
utilizando-se o peso inicial como co-variável. As eventuais diferenças entre as
médias foram avaliadas pelo teste F, por intermédio do procedimento GLM do
programa estatístico SAS versão 9.1. Adotou-se o nível de 5% de probabilidade.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
No experimento I, os suínos IM apresentaram maior (P≤0,05)
ganho de peso, melhor conversão alimentar e maiores percentuais de carne e
rendimento de carcaça em relação aos suínos MC (Tabela 2). O consumo de
ração diário, peso fi nal, peso e comprimento de carcaça, a espessura de
toucinho e a profundidade de músculo não foram infl uenciados (P>0,05) pelas
categorias.
tabNo experimento II, fase crescimento I, os suínos IM
apresentaram melhor (P<0,05) conversão alimentar em relação aos MC, enquanto
as demais variáveis avaliadas não foram infl uenciadas (P>0,05) pelas
categorias (Tabela 3). Na fase de crescimento II, os suínos MC apresentaram
menor (P≤0,05) consumo de ração diário em relação aos IM, porém as demais
variáveis não foram infl uenciadas (P>0,05). Na fase de terminação, os
suínos IM apresentaram maiores (P≤0,05) peso fi nal e ganho de peso
diário e menor (P≤0,05) conversão alimentar, bem como maiores (P≤0,05)
peso de carcaça e rendimento de carcaça quente, comprimento de carcaça,
espessura de toucinho e percentagem de carne, em relação aos castrados
cirurgicamente. Por sua vez, o consumo de ração diário e a profundidade de
músculo não foram infl uenciados (P>0,05) pelas categorias.
A superioridade dos suínos IM em relação aos MC, observada para a
conversão alimentar, no presente estudo, pode ser explicada considerando que os
suínos, previamente à imunocastração, mantêm o padrão metabólico dos machos não
castrados, uma vez que o efeito inibidor da secreção de esteroides testiculares
inicia somente após a aplicação da segunda dose da vacina (ZAMARATSKAIA et al.,
2008). O resultado obtido neste estudo está deacordo com a literatura (XUE et
al., 1997), em que se constata superioridade absoluta da efi ciência alimentar
dos machos não castrados em relação aos castrados. De modo similar, PAULY et
al. (2009) observaram melhor conversão alimentar dos IM em relação aos MC.
Diversos pesquisadores como JAROS et al. (2005) e PAULY et al.
(2009) relataram o aumento do consumo de ração diário na fase de terminação dos
animais imunocastrados. Porém, no presente estudo, não foram constatadas
diferenças (P>0,05) entre os grupos testados para esse parâmetro, na fase de
terminação.Os melhores resultados observados para orendimento de carcaça e
percentagem de carne dos suínos IM, nos experimentos I e II, também foram
relatados por outros pesquisadores (XUE et al., 1997; PAULY et al., 2009). Na
prática, a maioria dos leitões machos é submetida ao procedimento cirúrgico
para remoção dos testículos na primeira semana de vida.
Esse procedimento resulta na ausência das funções anabólicas
geradas pelos hormônios testiculares nas fases de recria e terminação (CAMPBELL
et al., 1985). A ausência dos hormônios testiculares diminui o potencial de
crescimento e aumenta a deposição de gordura na carcaça nos suínos MC (METZ
& CLAUS, 2003). Por sua vez, os suínos IM mantêm esse potencial anabólico
durante a fase de recria e ainda por alguns dias após a aplicação da segunda
dose da vacina, quando já estão na fase de terminação (CLAUS et al., 2007). Essas
diferenças no padrão metabólico justifi cam a superioridade dos suínos IM,
quando comparados aos MC, no presente estudo.
Na análise de sensibilidade para o cenário mais provável (Tabela
4), no experimento I, os animais IM apresentaram maior lucro bruto, resultando
numa diferença monetária de R$ 1,07 (0,04%) em relação ao grupo MC. No
experimento II, a lucratividade dos animais IM em relação aos MC foi superior
àquela observada no experimento I, em que o lucro bruto dos suínos IM
apresentou superioridade de R$ 22,39 (16,98%) em relação ao dos MC. Dessa
maneira, fi cou evidenciado o efeito do ganho acumulado durante as três fases
da produção, uma vez que o desempenho zootécnico dos animais IM foi superior ao
dos suínos MC desde a fase de crescimento I, resultando, consequentemente, em
menor custo de alimentação.
Na análise de sensibilidade para o cenário otimista, os resultados
seguiram o mesmo padrão do cenário mais provável. No experimento I, ocorreu uma
diferença maior no lucro bruto para os animais IM, resultando numa diferença
monetária de R$ 4,92 (1,47%) em relação ao grupo MC. No experimento II, a
lucratividade dos animais IM em relação aos MC foi superior àquela observada no
experimento I, em que o lucro bruto dos suínos IM apresentou superioridade de
R$ 28,25 (14,23%) em relação aos MC. A maior diferença monetária no cenário
otimista em relação ao cenário mais provável provavelmente está relacionada ao
potencial diferencial de efi ciência alimentar dos machos não castrados nas
fases de crescimento I e II, em relação aos castrados cirurgicamente.
Na análise de sensibilidade para o cenário pessimista, no
experimento I, o lucro bruto dos suínos IM foi similar ao dos suínos MC,
resultando numa diferença monetária de (-) R$ 2,78 (-1,39%), diferentemente do
observado nos cenários mais provável e otimista. Isso se deve ao fato de que,
no cenário pessimista, ocorreu diminuição na receita de bonifi cação, devido à redução
no preço pago ao suíno vivo (R$ kg-1), diminuindo a diferença na receita entre
os grupos IM e MC, associado ao aumento no custo da vacina.
No experimento II, a lucratividade dos animais IM em relação aos
MC foi superior àquela observada no experimento I, em que o lucro bruto dos
suínos IM apresentou superioridade de R$ 16,54 (25,37%) em relação aos MC. Esse
resultado evidencia a importância de analisar todo o processo de produção, pois
os ganhos obtidos nas fases de crescimento I e II infl uenciaram diretamente no
lucro bruto. A maior lucratividade para os animais imunocastrados do
experimento II, no cenário pessimista em relação aos demais cenários, pode ser
explicada principalmente pelo aumento do custo da dieta, variável que
representa a maior parte dos custos de produção.
No presente estudo, os animais imunocastrados apresentaram signifi
cativamente melhor conversão alimentar na fase de crescimento I, menor consumo
de ração na fase crescimento II, melhor conversão alimentar e maior ganho de
peso diário na fase de terminação. A relação de troca (kg de suíno por kg de
ração) foi menor, impactando diretamente na diminuição dos custos e aumentando
a lucratividade.
Mesmo em condições de mercado desfavoráveis, a imunocastração foi
mais lucrativa, diminuindo os custos com a alimentação, desde que as
fases de crescimento I e II sejam incorporadas nos cálculos. As diferenças de
custos entre os sistemas de produção dos animais IM e MC ocorreu, no presente
estudo, sobre o consumo de ração e o custo da vacina. Como os animais do grupo
IM permanecem não castrados durante as fases de crescimento I e II,
apresentaram consumo superior aos MC, porém, esse custo é compensado fi
nanceiramente devido ao melhor desempenho. Por sua vez, o custo da vacina
implica diretamente o custo de produção dos IM, em que a redução no custo da
vacina aumenta o ganho por cabeça.
CONCLUSÃO
Suínos não castrados apresentam menor consumo de ração e melhor
conversão alimentar nas fases de crescimento em relação aos castrados
cirurgicamente. Na fase de terminação, suínos IM apresentam melhor ganho de
peso, conversão alimentar, rendimento de carcaça e porcentagem de carne em
relação aos MC. A utilização de machos IM aumenta a lucratividade na produção
de suínos. A análise de lucratividade deve considerar todas as fases de
criação, uma vez que o desempenho diferencial dos suínos não castrados na fase
de crescimento infl uencia economicamente os resultados da produção.
COMITÊ DE ÉTICA E BIOSSEGURANÇA
Declaramos que os animais utilizados em experimentação que
originou o artigo “Avaliação técnicoeconômica de suínos machos imuno e
cirurgicamente castrados”, submetido para publicação na revista Ciência
Rural, foram criados sob os princípios do bem estar animal. O abate foi
realizado em frigorífi co comercial com inspeção federal respeitando a
legislação quanto ao tempo de descanso, insensibilização e sangria.