S.O.S. Suínos
Informativo Técnico nº 76
SUINOCULTURA
AUTOR: MV.
Luciana Pires de Almeida Forte e Prof. Roberto de Andrade Bordin – DMV, M.Sc.
Anhembi Morumbi (UAM), São Paulo – Brasil
A atual inserção do Brasil no mercado internacional da carne suína é possivelmente
o resultado mais visível das grandes mudanças tecnológicas da sua suinocultura,
que vem impondo novas regras e técnicas ao setor (SILVEIRA & TALAMINI, 2007).
O setor de reprodução é de suma importância para o sucesso de uma cadeia
suinícola, no qual devem ser selecionados profissionais altamente qualificados
para que não haja prejuízos a produção. Dentre os diversos problemas
reprodutivos, podemos observar a ocorrência da distocia ou parto patológico.
Para que possamos identificar uma distocia e posteriormente realizar
qualquer intervenção é necessário o entendimento de todos os processos
fisiológicos que ocorrem no parto da porca. O parto normal requer a interrupção
das forças que mantêm a gestação, a ativa preparação dos fetos e da mãe para a
abertura do canal do parto e para as contrações que irão expulsar os fetos
(BERNARDI, 2007).
A distocia caracteriza-se pelas dificuldades ou impedimentos que o feto
encontra para ser expulso do útero, em decorrência de origem materna, fetal ou
de ambos (STAINKI, 2001). A distocia em porcas ocorre em
STAINKI (2001), afirma que, um exame clínico minucioso unido a
conhecimentos de anatomia, fisiologia, patologias da gestação, do parto e do
puerpério são fundamentais para estabelecer o diagnóstico, o prognóstico e o
auxilio obstétrico mais adequado.
O presente trabalho tem por objetivo, realizar uma revisão bibliográfica
acerca da distocia em fêmeas suínas verificando sua incidência nestes animais e
a partir disto considerar a característica geral deste processo.
2. Fisiologia normal do parto em porcas
Para que possamos identificar uma distocia e posteriormente realizar
qualquer intervenção é necessário o entendimento de todos os processos
fisiológicos que ocorrem no parto da porca. A compreensão do processo de
nascimento e dos mecanismos que o controlam permite que as anormalidades sejam
reconhecidas. Esse conhecimento é necessário para que não haja interferência
desnecessária durante situação normal, mas deve também servir para controlar o
momento da parição para que atendentes estejam presentes e, assim, realizem as
intervenções necessárias de modo a reduzir as perdas de leitões por
natimortalidade (BERNARDI, 2007)
O parto normal requer a interrupção das forças que mantêm a gestação, a
ativa preparação dos fetos e da mãe para a abertura do canal do parto e para as
contrações que irão expulsar os fetos. A expulsão dos fetos requer a
sincronização das contrações uterinas com as contrações da parede abdominal
(TABELA 1). O eixo hipotálamo-hipófise-adrenal dos fetos é ativado e o
resultante aumento de corticosteróides fetais inicia uma cascata de eventos
endócrinos, no organismo materno, que culminam com as contrações uterinas e
expulsão dos fetos. A ocorrência de fases regulares e frequentes de atividade
do miométrio, que ocorrem durante as 9h que precedem o parto, coincidem com o
aumento da concentração plasmática de ocitocina. A PGF2alfa também contribui para
a ocorrência de contrações uterinas adequadas e rápida expulsão dos fetos
(BERNARDI, 2007).
TABELA 1: Divisão do parto em três fases:
Fase |
Forças mecânicas |
Período |
Eventos |
Dilatação
cervical |
Contrações uterinas Regulares |
Do inicio das contrações uterinas até completa dilatação cervical |
- Agitação da fêmea; - Aumento dos batimentos cardíacos e
movimentos respiratórios. |
Expulsão dos fetos* |
Fortes contrações uterinas e abdominais |
Da completa dilatação cervical até o final da expulsão dos fetos |
- A fêmea se deita e faz esforços; - Ruptura do alanto-córion
e eliminação de fluido pela vulva; - Exposição da bolsa amniótica na vulva, sua ruptura e liberação do feto. |
Expulsão da placenta |
Contrações uterinas de menor Amplitude |
Do final da expulsão dos fetos até a expulsão de todas as placentas |
- Término dos esforços (contrações) abdominais); - Separação das membranas fetais da superfície uterina e sua expulsão. |
Fonte: SENGER, 2003
2.1 Mecanismo de desencadeamento do
parto
O parto é desencadeado pelos fetos, é completado por uma complexa interação
de fatores endócrinos, nervosos e mecânicos, embora suas funções precisas e
inter-relações não sejam completamente entendidas (BERNARDI, 2007).
O parto depende basicamente de dois processos mecânicos: a contração do
útero e a dilatação da cervix em grau suficiente para permitir a passagem dos
fetos. Durante a gestação, as contrações do miométrio possuem amplitude e
freqüência baixas, de modo a facilitar o crescimento dos fetos, sem
transtornos. Durante o trabalho de parto essas contrações são substituídas por
outras mais vigorosas e mais frequentes, de força expulsiva (ANDERSON, 1993).
A remoção do bloqueio da progesterona ocorre pelo fato do cortisol fetal
promover a síntese de enzimas que convertem progesterona em estradiol, na
placenta. Este evento explica a queda drástica do nível de progesterona e
aumento do nível de estradiol que ocorrem no final da gestação. Além de
estimular a conversão de progesterona em estradiol, o cortisol fetal estimula a
síntese placentária de PGF2alfa (SENGER, 2003).
2.2 Sinais do parto
A preparação para o parto inicia
Aumento de volume do úbere, na última semana de gestação, as glândulas
ficam individualmente delineadas. Um edema mais acentuado, indicativo de
formação de secreção láctea, ocorre 24 h antes da expulsão dos fetos e as
glândulas ficam mais túrgidas, sendo notado principalmente nos tetos. A ejeção
de secreção láctea, uma resposta induzida pela ocitocina, inicia quando faltam
aproximadamente 12h para o parto. Quando a secreção láctea torna-se facilmente
disponível, sendo obtida em jatos, o parto pode ser esperado entre
Nas 24h que precedem o parto, há mudanças comportamentais da fêmea que
aumenta o estado de alerta, manifesto pela agitação e o fato de levantar e
deitar com frequência. A fêmea reduz o apetite e as tentativas de defecar ou
urinar são mais frequentes. Geralmente, 12h antes do parto iniciam os sinais de
preparação do ninho, que incluem movimentos dos membros anteriores na tentativa
de amontoar ou empilhar material de cama ou alimento. Se algum material de cama
estiver disponível, a fêmea fica mastigando-o e remoendo-o em sua boca e, se
ela estiver em local com palha, irá construir uma cama. Em instalações
confinadas, estes sinais podem ser expressos por remexer ou mastigar, morder
barras ou outros objetos que estejam na baia ou gaiola. Suspeita-se que estes
sinais estejam associados com o inicio das dores do parto, mas há evidências de
que este comportamento já inicia antes da atividade uterina intensa.
Finalmente, há um período de relativa quiescência,
Ocorre edema e hiperemia da vulva,
3. Aspectos Conceituais da Distocia
A distocia é definida como um parto difícil, caracterizando-se pelas
dificuldades ou impedimentos que o feto encontra para ser expulso do útero, em
decorrência de origem materna, fetal ou de ambos. Pode variar desde um atraso,
até a incapacidade de parir. As conseqüências do parto distócico podem ser
(STAINK, 2001):
As distocias em suínos não são comuns quando comparadas às outras espécies,
ocorrendo em
As principais causas de distocia em porca podem ser de origem materna e de
origem fetal, sendo a primeira mais prevalente. Seguem abaixo as causas mais
comuns segundo JACKSON, 2006:
Origem materna:
Origem fetal:
Porém, há também as causas iatrogênicas de distocias, como o uso incorreto
de prostaglandinas e ocitocinas com intuito de controlar os partos (BRITT et al., 1999).
Dentre as mais freqüentes causas em ordem de incidência a que mais se
destaca é a Inércia uterina podendo ser verificada em um estudo de 200 casos
atendidos em fazendas mostrados na TABELA 2.
TABELA 2: Causas de distocia em porca e suas
respectivas incidências.
Causa |
% |
Inércia Uterina |
37,0 |
Obstrução do canal do parto |
13,0 |
Desvio do útero |
9,5 |
Excitamento materno |
4,0 |
Má disposição
fetal |
3,5 |
Desproporção feto
pélvica |
3,0 |
*Em alguns casos, mais de uma agente causador estava presente.
Fonte: Jackson, (1975).
3.1 Inércia Uterina
É a causa mais comum de distocia de origem materna
Inércia uterina Primária:
A inércia primária é a falha do útero em iniciar as contrações no parto.
Vários fatores podem estar envolvidos, como balanço hormonal, nutrição,
ambiente e doenças (ASH, 1986).
Existem duas formas de inércia uterina primária observada nas marrãs: a da
fêmea com toxemia (60%) e a observada nas fêmeas sem toxemia (aprox. 40 %):
a) Inércia uterina em fêmeas com toxemia: Animais apresentam sinais de
debilidade antes do parto, secreção vaginal de odor fétido podendo estar
associadas a infecções principalmente por parvovírus suíno. A mucosa vaginal
apresenta-se ressecada e fibrosa, membranas fetais estão separadas da suas
inserções uterinas e estão ressecadas e a vagina esta preenchida com ar. A
resposta com ocitocina é variável e o prognóstico para as marrãs acometidas é
muito ruim (JACKSON, 2006).
b) Inércia uterina em porcas sem toxemia: As porcas afetadas geralmente
estão espertas e alegres. A cervix esta dilatada, os fetos são palpáveis, mas
sem contração uterina presente. Mais de 20 % dos leitões podem estar mortos. A
causa exata a essa condição é desconhecida e o cálcio materno é normal
(JACKSON, 2006).
Inércia Uterina Secundária:
É a forma mais comum de inércia uterina suína. Em todos os casos alguns
fatores primários (ambientes barulhentos, temperaturas elevadas, intervenção do
criador, toque vaginal no momento não apropriado ou aplicações de ocitocina em
doses muito elevadas) atrasam o parto resultando em cansaço da musculatura
uterina. Geralmente vários leitões já nasceram e existe um histórico de forças
mal sucedidas. Os fatores primários comuns incluem um leitão morto mal
posicionado, apresentação simultânea de dois ou mais leitões ou uma obstrução
no canal do parto. A taxa de natimortos pode ser 40 % (JACKSON, 2006).
Inércia Uterina Idiopática:
Nesta condição as contrações uterinas cessam durante a segunda fase do
parto (fase de dilatação), além disso, não ocorre dilatação da cervix. A
condição parece ter mais incidência em porcas obesas e em algumas porcas os
níveis de cálcio são ligeiramente reduzidos. A causa precisa é desconhecida,
mas a condição é responsiva a ocitocina. A taxa de natimortos pode ser 10 %
(JACKSON, 2006).
4. Procedimentos
Antes de optar pela intervenção no parto, é indispensável o exame geral da
fêmea, com especial atenção ao aparelho circulatório e respiratório
(SOBESTIANSKY et al., 2001).
Se a manipulação obstétrica for realmente necessária, esta deverá ser
conduzida com o máximo de cuidados higiênicos, pois podem ser introduzidos
microorganismos patogênicos no ambiente genital, principalmente enterobactérias
(MEREDITH, 1995). A intervenção inclui exame manual da vagina, cervix ou até
onde se consegue palpar, removendo obstáculos de obstrução ou fetos mal
apresentados (BRITT et al.,
1999).
Quando necessário intervir deve-se:
Uma vez, identificado uma distocia de origem fetal, procede-se a correção
da posição e retira-se o leitão. No caso de inércia uterina e, quando após o
toque vaginal constatar-se que não existam obstáculos a saída dos leitões
recomenda-se aplicar carbetocina ou ocitocina (
5. Conclusão
Foi possível concluir através desta revisão de literatura que a incidência
da distocia em porcas é baixa em relação ao índice de palpações realizadas nas
granjas, nos levando a crer que muitas vezes, pode haver precipitações ou
inexperiência por parte dos funcionários.
O índice de intervenções vaginais no momento do parto observado ao longo de
um ano produtivo é elevado em uma propriedade, sugerindo que muitas destas
palpações podem estar sendo efetuadas sem real necessidade, devido à falta de
conhecimento dos mecanismos e procedimentos aos quais devem ser considerados no
parto da porca.
A presença do Médico Veterinário ou técnicos capacitados, observando os
partos e os aspectos da reprodução dos suínos, bem como capacitando a equipe de
maternidade para uma melhor observação e realização dos procedimentos ligados
ao parto, é essencial para aumentar a eficiência produtiva das fêmeas suínas.
6. Bibliografia
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STAINK, D. R. Notas de Aula. Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul - Campus Uruguaiana, 2001.
DATA DE PUBLICAÇÃO: 14/04/2009
QUALIFICAÇÃO
AUTOR: MV.
Luciana Pires de Almeida Forte e Prof. Roberto de Andrade Bordin – DMV, M.Sc.
Anhembi Morumbi (UAM), São Paulo – Brasil
ENGORPART
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