Alimentos alternativos para suínos em crescimento e
terminação
Autor/s. : Andrea Machado Leal Ribeiro, Professora
Associada do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS), RS; João Dionísio
Henn, Aluno de Doutorado do PPG-Zootecnia, Professor da Universidade
Comunitária da Região de Chapecó (UNOCHAPECÓ), SC, e Gabriel Luz da Silva,
Aluno de graduação do curso de Medicina Veterinária da UFRGS, RS.
Sumário
Esta revisão faz um
levantamento dos principais alimentos alternativos ao milho e farelo de soja
que podem ser usados nas dietas de suínos em crescimento e terminação e suas
limitações nutricionais. São classificados como essencialmente energéticos tais
como a raiz de mandioca, a quirera de arroz, o caldo de cana e o glicerol;
energéticos com proteína mais elevada do que a do milho, como o farelo de arroz
integral, a soja integral e a ervilha; fornecedores de proteína como o farelo
de arroz desengordurado, e fornecedores de proteína com baixa energia como os
fenos de leucena e de folha de mandioca. Sempre que houver disponibilidade de
uso de um alimento alternativo, é necessário conhecer seu valor nutricional, a
presença de fatores antinutricionais e suas limitações nas diferentes
categorias animais. No uso de subprodutos ou resíduos que envolvam
processamento, como é o caso dos DDGS, uma constância nos fatores envolvidos no
processo é importante para diminuir a variabilidade do produto final. Como
conclusão, a suinocultura conta com várias opções de alimentos alternativos. No
entanto, sua utilização dependerá de sua disponibilidade local e regional, do
preço e de suas características nutricionais.
Descritores: Ingredientes, Formulação de rações, Nutrição, Suínos.
1. Introdução
Nos últimos anos, a
suinocultura brasileira tem experimentado diversos períodos de instabilidade,
em função do baixo preço do produto associado aos elevados custos de produção.
Os ingredientes mais utilizados nas dietas de suínos, milho e farelo de soja,
tiveram elevação de preço, refletindo na margem de lucro do suinocultor. Neste
contexto pesquisas envolvendo a utilização de alimentos alternativos são
importantes, com destaque para subprodutos ou resíduos, para novas formas de
utilização de produtos e subprodutos e para as limitações destes materiais nas
diferentes categorias animais. O possível uso dos alimentos alternativos na
alimentação de suínos, dependerá do reconhecimento das suas potencialidades e
restrições, de modo a manterem produtividade e possibilitarem redução dos
custos de produção, com reflexos diretos sobre a viabilidade e lucratividade da
atividade. Outro importante aspecto é sua disponibilidade, pois de nada adiantam
alimentos alternativos com excelente matriz nutricional se, por motivos
culturais ou agronômicos, não se encontram disponíveis.
De acordo com
Bellaver & Ludke (2004), as alternativas de alimentação de suínos
disponíveis para uso direto nas granjas são restringidas aos macro-ingredientes
de origem vegetal, que podem ser:
a) Essencialmente
Energéticos: raiz de mandioca (in natura, silagem da raiz, raspa integral,
farinha e farelo residual) e caldo de cana. O nível de proteína nesses
ingredientes é baixo, exigindo que seja aumentada a proporção das fontes
protéicas, o que representa uma importante limitação. A raspa (seca) integral
da raiz de mandioca em termos percentuais pode responder por até 50% da dieta.
O caldo de cana apresenta em termos comparativos uma energia metabolizável de
3202 Kcal/kg quando expresso com um valor hipotético de 88% de matéria seca.
Entretanto, este ingrediente é de difícil manejo e transporte, podendo até
mesmo inviabilizar a sua utilização.
b) Energéticos
idênticos ao milho: sorgo, milheto, grão de arroz e arroz na forma de quirera.
Apresentam a possibilidade de substituição total do milho causando apenas
pequenos ajustes na porcentagem dos demais ingredientes da ração. No mesmo
grupo podem ser incluídas muitas sementes de gramíneas. Porém, algumas delas
(principalmente as tropicais) apresentam valor energético muito menor do que o
milho. A silagem de grão de milho úmido pode ser estrategicamente usada visando
à redução em até 28 dias no tempo de ocupação da lavoura e a sua inclusão nas
dietas de todas as categorias de suínos pode ser realizada via substituição
total do milho desde que realizados os ajustes em função do teor de umidade, da
maior disponibilidade dos minerais e, proporcionalmente a um mesmo nível de
umidade, maior valor de energia metabolizável.
c) Fornecedores de
energia com nível de proteína mais elevado do que o milho (pelo menos acima de
14%): farelo de arroz integral (muito sensível à rancificação), semente de
girassol e soja integral inativada (tostada, cozida, extrusada). São os
ingredientes que apresentam elevado teor de extrato etéreo e por esse motivo
apresentam maior densidade energética. São recomendados para substituir entre
75 a 100% da proteína fornecida pelo farelo de soja em dietas para matrizes em lactação.
A soja devidamente processada pode ser incluída em até 20% nas dietas
nutricionalmente equilibradas a serem fornecidas para os leitões nas dietas
pré-iniciais e iniciais. Para suínos em terminação o elevado teor de gordura
insaturada afeta a qualidade da gordura na carcaça. A inclusão do farelo de
arroz integral em rações para suínos em crescimento e terminação deve ser
restringida até um máximo de 30% da dieta.
d) Fornecedores de
proteína: farelo de algodão, farelo desengordurado de arroz, farelo de girassol
e sementes de leguminosas, em especial o guandú, entre outros. São ingredientes
aptos à inclusão em dietas de suínos em crescimento e terminação e fêmeas em
gestação, substituindo entre 50 a 75% da proteína oriunda do farelo de soja.
Como regra geral as sementes de leguminosas apresentam, em níveis variados,
fatores antinutricionais que devem ser adequadamente inativados (exceção feita
para a ervilha).
e) Fornecedores de
proteína com baixa energia: feno de leucena, feno da folha de mandioca que podem
substituir parcialmente o farelo de soja, são ingredientes preferenciais para
serem incluídos em proporção definida (no máximo 10%) nas dietas de fêmeas em
gestação porque apresentam elevado teor de fibra bruta e baixa densidade
energética.
A utilização de
qualquer alimento alternativo depende essencialmente da disponibilidade local e
regional de ingredientes que tenham preços compatíveis com os preços pagos por
quilograma de suíno. O objetivo neste trabalho é apresentar e discutir
informações científicas sobre alguns alimentos alternativos disponíveis no
Brasil, mesmo que de forma sazonal, para suínos nas fases de crescimento e
terminação.
2. Arroz (Oryza sativa)
O arroz é
mundialmente produzido para ser aproveitado na alimentação humana. Entretanto,
quando não estiver dentro das especificações para tal ou quando razões
econômicas o permitem, pode ser utilizado na alimentação animal.
Além deste, os
subprodutos farelo de arroz gordo, farelo de arroz desengordurado e a quirera
de arroz podem ser fontes importantes para as dietas dos suínos.
2.1
Farelo de Arroz Integral (FAI)
Representa cerca de
13% do peso dos grãos e consiste do pericarpo, gérmen, fragmentos de arroz e
pequenas quantidades de casca, com granulometria semelhante ao farelo. Sua composição
química é variável em função do tipo de processamento. Proteína, fibra e
gordura são superiores ao milho, e o amido e a gordura são as principais fontes
de energia deste ingrediente. Sua proteína é rica em aminoácidos sulfurados,
porém a lisina e a treonina, dois aminoácidos essenciais, são os mais
limitantes. O FAI possui alto teor em vitaminas do complexo B, como tiamina,
riboflavina e niacina. Os fatores que limitam o uso do FAI na alimentação de
suínos são a presença de casca que possui altos teores de celulose e sílica, os
oxalatos e fitatos, que são fatores antinutricionais, além do alto teor de
fósforo.
O conteúdo de gordura
deste subproduto é alto em ácidos graxos insaturados facilmente peroxidáveis,
como o ácido palmítico, linoléico e oléico. A peroxidação da gordura reduz o
valor nutricional do alimento, principalmente em relação à energia e às
vitaminas. Para contornar o problema, a adição de antioxidantes é fundamental.
Campos et al. (2002)
avaliaram o efeito da inclusão do FAI para suínos em crescimento e terminação,
concluindo que a inclusão de 30% provocou menor ganho de peso e pior conversão
alimentar em relação à testemunha, porém sem alterar as características da
carcaça. Por outro lado, Bertol et al. (1990) verificaram que níveis crescente
de FAI não prejudicaram o desempenho, tendo o FAI substituído 100% do milho nas
dietas de suínos, nas fases de crescimento e terminação. Fireman (2000)
suplementou dietas de suínos em crescimento, contendo 50% de FAI, com as
enzimas fitase e xilanase, e observou que as enzimas sós ou combinadas,
melhoraram a digestibilidade das dietas. Este é mais um campo que a nutrição
abre atualmente. O do uso de enzimas exógenas para melhorar o aproveitamento do
animal a ingredientes alternativos.
2.2 Farelo
de Arroz Desengordurado (FAD)
O FAD representa
aproximadamente 82% do peso do farelo de arroz integral. Apresenta teores de
proteína e fibra superiores e de gordura e energia digestível inferiores,
quando comparado ao milho. Devido ao baixo teor de gordura, não apresenta
problemas de deterioração, observados no farelo de arroz integral.
Em regiões orizícolas
tradicionais, os subprodutos do arroz são comumente utilizados na alimentação
animal. No Rio Grande do Sul, destaca-se a produção de arroz irrigado, com uma
produção média anual de 7,8 milhões de toneladas (CONAB, 2009). No
beneficiamento para o consumo humano, são obtidos 6,5% de FAD, totalizando
assim 507 mil toneladas anuais no estado. O FAD contém aproximadamente 15,5% de
proteína, 24,3% de fibra em detergente neutro, 15,8% de fibra em detergente
ácido, 1,6% de extrato etéreo e 2530 e 2450 kcal/kg de dieta de energia
digestível e metabolizável, respectivamente. Tais valores justificam a inclusão
desse subproduto na matriz nutricional de suínos em crescimento e terminação
(Rostagno et al., 2005). No entanto, existem algumas limitações no uso do FAD
na alimentação de suínos. O alto teor de fibra aumenta a taxa de passagem do
alimento no trato gastrintestinal reduzindo a absorção dos nutrientes (Le Goff,
2002). Além disso, Malathi & Devegowda (2001) descrevem que a porção
fibrosa do FAD é constituída principalmente por polissacarídeos não-amiláceos
estruturais (PNA). Efeitos negativos dos PNA sobre a digestibilidade acontecem
devido ao aumento da viscosidade do conteúdo intestinal, o que reduz a
interação enzima/substrato pela diminuição da taxa de difusão dos nutrientes na
luz intestinal e pela complexação com as enzimas digestivas (Bedford, 2000). O
FAD ainda contém cerca de 80% de todo o fósforo sob a forma de ácido fítico, o
que indisponibiliza além do próprio fósforo, uma série de outros nutrientes,
podendo formar sais insolúveis com minerais e complexos com proteínas, além de
diminuir a atividade das enzimas proteolíticas (Selle et al., 2000). Em estudo desenvolvido
com suínos nas fases de crescimento e terminação, alimentados com dietas
contendo 30% de FAD, Ludke et al. (2002) demonstraram uma redução no ganho de
peso dos animais. Já Warren & Farrell (1990) afirmaram que as dietas com
até 30% de FAD resultam em um aceitável desempenho dos suínos quando o consumo
de energia digestível for constante.
Kunrath (2010), em
recente trabalho desenvolvido no LEZO-UFRGS estudou o valor nutricional do FAD
na alimentação de suínos nas fases de crescimento e terminação. O valor
de EM obtido foi de 2429 kcal/ kg, na fase de crescimento, e de 2293 kcal/kg,
fase de terminação, respectivamente. O autor também observou que a metodologia
para avaliar a energia e a digestibilidade dos nutrientes pode ser determinante
para os valores obtidos, o que traz alguns questionamentos quanto aos valores
das tabelas de composição.
De uma forma geral
pode-se dizer que o uso do FAD na alimentação de suínos é limitado pelo alto
teor de fibra bruta e de fósforo, podendo ser incluído em até 30% nas dietas de
crescimento e terminação.
2.3
Quirera de Arroz (QA)
A QA é composta por
grãos defeituosos e quebrados após o polimento para consumo humano,
representando cerca de 10% do total processado. Pode ser encontrada em graus
variados de limpeza e os principais contaminantes são cascas de arroz, sementes
de capim-arroz (Equinocloa spp) e angiquinho (Aeschinomene
spp). Possui valor nutricional semelhante ao milho para
suínos, podendo ser utilizado sem restrições nas dietas de suínos em crescimento
e terminação.
A QA é um produto de
alta qualidade que possui níveis protéicos e de energia metabolizável
semelhantes aos do milho. Embora apresente um nível de gordura inferior ao do
milho, a QA compensa essa característica com elevado teor de amido (Rostagno et
al., 2005). Segundo o mesmo autor, o milho apresenta energia bruta
superior à da QA (3925 x 3821kcal/kg), porém o nível de energia metabolizável
aparente para suínos é levemente superior na QA (3491 x 3340 kcal/kg), o que
denota um melhor aproveitamento do ingrediente pelo animal. Ainda comparada ao
milho, a QA apresenta um nível de fibra bruta inferior e de lisina e metionina
levemente superiores, permitindo a formulação de dietas com menor nível de
aminoácidos sintéticos, reduzindo o custo da ração. Um ponto a ser ressaltado é
o nível de triptofano mais elevado. Dependendo dos demais ingredientes, a
dieta, em função da quirera, poderá apresentar excesso desse nutriente,
desencadeando a liberação de serotonina e inibindo o consumo de alimento.
Uma das grandes
vantagens da utilização de QA na dieta dos suínos é a ausência ou o nível muito
reduzido de micotoxinas, devido à forma de colheita e processamento do arroz
(Butolo, 2002). As aflatoxinas levam à degeneração gordurosa hepática e induzem
diversas alterações, principalmente o aumento da atividade das enzimas,
coagulopatias e diminuição na produção de proteínas. Marin et al. (2002)
sugerem que as aflatoxinas afetam não só o fígado dos monogástricos, mas também
o intestino, os rins e o baço.
Kiefer & Quadros
(2006) avaliaram o desempenho (Tabela 1) e as características quantitativas da
carcaça de suínos (Tabela 2), nas fases de crescimento e terminação, quando
alimentados com dietas contendo QA em substituição ao milho.
Tabela
1: Peso inicial (PI), peso final (PF), ganho de peso diário
médio (GMD), consumo de ração diário médio (CDM) e conversão alimentar (CA) de
suínos nas fases de crescimento e terminação, alimentados com diferentes níveis
de QA em substituição ao milho.
Tabela
2: Peso de carcaça quente (PCQ), rendimento de carcaça
quente (RCQ), espessura de toucinho (ET), profundidade de músculo (PM) e
percentagem de carne magra (CM) na carcaça de suínos alimentados com diferentes
níveis de QA em substituição ao milho.
Como conclusão, a QA
pode substituir totalmente o milho nas dietas de suínos nas fases de
crescimento e terminação, sem prejudicar as características quantitativas da
carcaça, com melhorias , inclusive, na conversão alimentar.
3.
Trigo (Triticum
spp.)
O trigo é uma
gramínea de inverno muito importante pela sua tradição milenar de cultivo e
consumo humano e por seu valor nutricional como alimento. O trigo e seus
produtos podem ser caracterizados da seguinte forma, de acordo com Butolo
(2002):
- Grão integral de trigo moído: consiste no grão
do trigo moído.
- Farelo de trigo: é o produto obtido do
processamento industrial do trigo.
Farelo de gérmen de trigo: consiste do gérmen e outras pequenas partículas resultantes do processamento industrial do grão de trigo integral para obtenção da farinha de trigo para consumo humano. - Remoído de trigo: é o produto obtido no
processamento do grão de trigo, constituído de uma mistura de farelo,
gérmen e farinha de trigo.
- Triguilho: são grãos pouco desenvolvidos, mal
granados ou chochos, resultantes de lotes cujo peso específico é menor que
o exigido para moagem, ou produto resultante da classificação do trigo
após a eliminação de impurezas.
Em geral, a
composição do trigo é mais variada que a dos cereais. A proteína do trigo é
superior à do milho em concentração, qualidade e composição aminoacídica.
A suplementação com lisina e treonina pode reduzir o uso de farelo de
soja, nas fases de crescimento e terminação. No aspecto da energia, o amido
representa 60% do grão (25% amilose e 75% de amilopectina). Apresenta, segundo
Rostagno et al. (2005), teor de energia digestível semelhante ao milho. A
energia metabolizável, entretanto, é cerca de 10% inferior. O trigo contém
entre 1 a 2% de lipídios, enquanto que o milho tem 3,7%, em média.
Como fatores
antinutricionais, o farelo de trigo possui pentosanas (PNA) e inibidores de
tripsina e quimiotripsina. Os níveis destes fatores antinutricionais podem
limitar sua inclusão na ração de suínos, em substituição ao milho, uma vez que
o desempenho dos animais pode ser prejudicado devido ao pior aproveitamento dos
nutrientes das rações. Fialho et al. (1998) encontraram a seguinte composição
para o farelo de trigo: MS=74,4%; PD=11,38%; ED=2520 Kcal/kg e EM= 2305
Kcal/kg.
Pode-se recomendar a
utilização de níveis de até 30% de farelo de trigo nas dietas de suínos em
crescimento e terminação.
4.
Triticale (Triticosecale
rimpaui Wittm)
O triticale apresenta
teor protéico 22% mais alto que o do milho, com um perfil melhor de
aminoácidos, principalmente lisina (NRC, 1998). Algumas variedades têm níveis
de lisina 50% mais elevados que o milho, diminuindo em até 3% a inclusão de
farelo de soja nas dietas de suínos.
Existem algumas
limitações para o uso do triticale na alimentação de suínos devido aos
polissacarídeos não amiláceos (PNA). No entanto, a adição de complexos
multienzimáticos como celulases, hemicelulases e xilanases pode viabilizar a
substituição do milho por triticale em rações de suínos. Hauschild e
colaboradores (2008) verificaram que a inclusão de até 60% de triticale em
dietas para suínos em crescimento, não afetou a digestibilidade dos nutrientes,
a energia digestível e metabolizável e o balanço do N, mas reduziu a proteína
digestível aparente. Já a adição de enzimas melhorou a digestibilidade da
proteína em dietas com 30 e 60% de inclusão de triticale.
5.
Ervilha (Pisum
sativum)
O grão de ervilha é
uma cultura de inverno pouco utilizada em rações de suínos e aves no Brasil
devido à falta de informações sobre o valor nutricional do grão e da pouca
disponibilidade para comercialização. Entretanto, essa leguminosa pode se
constituir em excelente alimento para os animais, reduzindo o custo das rações.
A ervilha apresenta duas características que a tornam altamente desejável: é
uma rica fonte de aminoácidos e não apresenta níveis consideráveis de fatores
antinutricionais, não requerendo processamento térmico para sua utilização, ao
contrário de outras leguminosas, como a soja. Essa vantagem faz da ervilha uma
excelente opção de produção de alimento no inverno. Além de proporcionar cobertura
do solo e incorporar nitrogênio ao mesmo, a ervilha pode se constituir em fator
decisivo para aumento da rentabilidade dos sistemas de produção de suínos,
especialmente nas propriedades familiares, constituindo-se em fator importante
para aumentar a sustentabilidade desses sistemas.
Vieira et al. (2003)
concluíram que o grão de ervilha da sub-espécie hortense, cultivar Alfetta, é
uma alternativa viável na alimentação de suínos em fase de crescimento. A
inclusão deste grão até o nível de 40% não prejudicou o desempenho animal. Na
formulação de rações com ervilha para suínos desta categoria, são sugeridos
valores de energia digestível e metabolizável aparentes de 3.968 e 3.723 kcal
por kg de matéria seca, respectivamente.
Para Lima et al.
(2002), a ervilha tem excelentes possibilidades de ser utilizada em rações de
suínos em substituição ao milho (3420 kcal EM/kg e 0,24% de lisina) e ao farelo
de soja (3309 kcal EM/kg e 2,77% de lisina), sugerindo valores médios de
energia metabolizável de 3256 kcal/kg e de lisina de 1,51%.
6.
Glicerol
O glicerol é uma
substância solúvel em água, viscosa, sem odor e com sabor doce. É derivado
tanto de fontes naturais (constitui cerca de 10% dos triglicerídeos das
gorduras animais e dos óleos vegetais), quanto da indústria petroquímica. É
obtido de triglicerídeos a partir do processo de produção de sabões, com o
isolamento dos ácidos graxos e, atualmente, pela transesterificação, durante a
obtenção do biodiesel. Para cada litro de biodiesel produzido, aproximadamente
80 g de glicerol são obtidos (Kerr et al., 2008).
A eficiência do
processo de produção de biodiesel estabelece, de maneira indireta, variações
nos valores de energia bruta do glicerol. Quanto melhor o processo, menor a
concentração de energia do mesmo. Além das variações na energia, deve-se dar
atenção aos teores de sódio e metanol. O resíduo de metanol pode ser um
problema, quando encontrado no glicerol. No metabolismo, o metanol se
transforma em formiato, que afeta o sistema nervoso central, causando vômito, severa
acidose metabólica, cegueira e ação sobre o sistema motor. Kerr et al. (2008)
incluíram na dieta 10% de glicerol com 0,32% de metanol (320 ppm de metanol)
não encontrando sintomas de intoxicação por formiato.
Os estudos
desenvolvidos com suínos na fase de engorda indicaram que o glicerol é
altamente palatável e digestível, podendo ser adicionado em até 10% da ração
sem comprometer desempenho (Kijora et al., 1995; Kerr et al., 2008;
Berenchtein, 2008; Henn & Zanin, 2009). Além disso, pode trazer
benefícios à qualidade da carne dos animais, particularmente, pela maior
capacidade de retenção de água no músculo Longissimus
dorsi (Berenchtein,
2008; Mourot et al.,1994).
Holtkamp et al.
(2007) relataram que o glicerol proveniente da produção de biodiesel contém
aproximadamente 85% de glicerol, 10% de água e 3 a 7% de sais. Possui energia
bruta na faixa de 3600 a 3750 kcal/kg, dependendo de sua pureza (glicerol puro
contém 4305 kcal/kg de energia bruta). Para suínos em crescimento,
Lammers et al. (2008) obtiveram, para
uma glicerina com 87% de glicerol, EM de 3207 kcal/kg. Estes autores
realizaram 5 ensaios, cujos resultados estão resumidos na Tabela 3. No ensaio
com leitões (11 kg), houve efeito do nível de inclusão da glicerina na EM (5% -
3601 Kcal EM/Kg; 10% - 3239 Kcal EM/Kg e 20% - 3579 Kcal EM/Kg), isto é, o
nível de inclusão altera a EM do ingrediente, o que torna-se um fato
complicador no uso deste ingrediente.
Tabela
3: Valores para a energia metabolizável (EM) do glicerol
para suínos de diferentes pesos (Lammers et al. 2008)
7. DDGS (dried distiller grains with
solubles)
A produção de etanol
está aumentando consideravelmente no mundo todo, a partir da fermentação de
açúcares de diversas matérias primas. Os resíduos secos e solúveis de
destilaria (DDGS) são os subprodutos resultantes desse processo (Fialho et al.,
2009), correspondendo a aproximadamente 30% do cereal empregado. Alimentos ricos
em açúcar ou amido apresentam maior rendimento para a produção de etanol. Nos
Estados Unidos, atual maior produtor de etanol, o milho é o principal alimento
usado como substrato. No Canadá e na Europa, usa-se mais o trigo e a cevada. No
Brasil, segundo maior produtor mundial de etanol, a produção se dá à base da
cana-de-açúcar. Entretanto, comparada aos grãos utilizados em outros países, a
cana-de-açúcar, após produção de álcool, apresenta baixo valor nutritivo para
os suínos.
Um aspecto importante
na avaliação de DDGS é a sua composição em macro e microelementos. Como o DDGS
corresponde a aproximadamente 1/3 do valor total do milho, tendo os outros 2/3
sido transformados em etanol e dióxido de carbono, as concentrações de minerais
deveriam ser aproximadamente três vezes àquelas do grão de milho, o que pode
tornar-se uma limitação no seu
uso. Os DDGS de alta qualidade
apresentam valores de energia digestível e metabolizável semelhantes aos do
milho. De acordo com o NRC (1998), os valores de ED e EM do DDGS de milho para
suínos são 3200 e 2820 kcal/kg, respectivamente.
O efeito da inclusão
de DDGS de milho em dietas de suínos em crescimento e terminação foi estudado
por Withney et al. (2006). As dietas tiveram níveis similares de lisina, cálcio
e fósforo, sendo que os DDGS foram incluídos em 0, 10, 20 e 30%. Os níveis de
20 e 30% de inclusão comprometeram o ganho de peso, mas não afetaram o consumo
de alimento. Entretanto, o nível de 30% comprometeu a eficiência alimentar, a
espessura de lombo e a firmeza da carcaça. Por outro lado, espessura de
toucinho e percentagem de carne magra não foram afetados pelos níveis de DDGS.
Em termos de
limitações deste ingrediente, podemos citar que as micotoxinas presentes na
matéria-prima serão concentradas no DDGS e que a pequena qualidade das
proteínas do DDGS exige uma atenção especial aumentando a suplementação
de aminoácidos e assim o custo da alimentação total.
8.
Sorgo (Sorgum
vulgare)
O sorgo encontra-se
entre os cereais mais cultivados no mundo, usado na produção de amido
industrial, farinha, cerveja e óleo comestível. Também é usado na alimentação
animal, onde nas dietas de suínos pode substituir parcial ou totalmente o milho
como fonte energética. O grão de sorgo apresenta teor de proteína de 8 a 9%, geralmente
um pouco superior ao do milho. De acordo com Fialho et al. (2009), o sorgo
apresenta menor digestibilidade, uma vez que a proteína e o amido do endosperma
estão ligados às prolaminas e que possui 5,6% de polissacarídeos não-amiláceos
(PNA), divididos entre os arabinoxilanos (4,6%) e os ß-glucanos (1,0%).
Entretanto, como o custo do sorgo é cerca de 20% menor em relação ao milho, com
valor biológico de 95% do segundo, o sorgo pode substituir em até 100% o milho
nas dietas de suínos, sem prejudicar o desempenho dos animais. Segundo Marques
et al. (2007), a substituição em até 50% do milho não influi na digestibilidade
das dietas e no metabolismo dos animais.
O sorgo produz
compostos fenólicos que servem como proteção para a planta contra infecções e
pássaros. Um desses compostos é o tanino, o qual apresenta-se como um fator
anti-nutricional especialmente para monogástricos. O tanino é responsável pela
inibição de algumas enzimas presentes no sistema digestivo, diminuindo assim a
absorção dos nutrientes através da parede intestinal (Fialho et al.,
2009). O tanino, presente no pericarpo dos grãos de sorgo,
apresenta-se de duas formas: condensado e hidrolisável. Os primeiros são
resistentes à hidrólise e esta característica é que é responsável pela
inibição de enzimas no sistema digestivo. O maior problema que o tanino pode
causar, quando presente, é a complexação com proteínas, o que acaba
prejudicando a digestibilidade, e também modifica a palatabilidade (sabor
adstringente). Segundo Fialho et al. (2009), o milho pode ser substituído na
proporção de 100% e 85% pelo sorgo de baixo tanino e alto tanino
respectivamente. Se estiver disponível na região, em rações de mínimo custo, a
substituição do sorgo pelo milho é viável quando o preço do sorgo for 15% a 20%
inferior ao do milho.
9.
Milheto (Pennisetum
glaucum L.)
O grão de milheto tem
sido estudado e utilizado em substituição ao milho na alimentação de suínos,
tendo em vista o crescimento desta cultura no Brasil e sua boa adaptação às
condições climáticas brasileiras. Embora o milheto apresente menor valor de
energia digestível que o milho, sua inclusão em rações para suínos tem sido
considerada opção viável economicamente. O teor protéico do milheto é um fator
bastante interessante do ponto de vista econômico, uma vez que é superior ao
milho e ao sorgo (Adeola & Orban, 1995). Estes autores obtiveram valores de
proteína bruta de 11,4% para o milho e 15,0 e 16,6% para as duas variedades de
milheto testadas, valores 33 e 48% mais elevados. O milheto possui ainda maior
quantidade de aminoácidos essenciais que o milho, inclusive a lisina, principal
aminoácido limitante nas dietas compostas por milho e farelo de soja.
Segundo Bastos et al.
(2002), a inclusão de até 60% de milheto em rações para suínos, nas fases de
crescimento e terminação, não provocou redução no desempenho, nem alterou as
características de carcaça. Bastos et al. (2006) concluíram que
quando o custo do milheto corresponde a 70% do valor do milho, a inclusão do
milheto em níveis de até 75% em rações para suínos nas fases de crescimento e
terminação é economica e nutricionalmente viável.
10. Germe de milho desengordurado
Este alimento é um
subproduto da industrialização do milho para retirada do amido por via úmida.
Durante o processo, o milho é umedecido para amaciar a semente e facilitar a
separação do glúten, proteína e gérmen. Após a remoção do gérmen, restam apenas
o glúten, o amido e a casca do milho (Patience et al., 1995). Aproximadamente,
25% da composição do germe de milho é óleo (Ohiocorn, 2000). Logo, o farelo de
gérmen de milho desengordurado é obtido da extração do óleo. Segundo Honeymann
(1989), citado por Trindade Neto et al. (1995), para cada 100 kg de milho em
grãos, são produzidos 62 a 68 kg de amido, 3 kg de óleo, 3,2 kg de farelo de
germe, 20 kg de glúten e 4,5 kg de farelo de glúten.
Buttolo et al.
(2000), trabalhando com frangos de corte, determinaram que a EM do germe foi de
2393 kcal/kg, cerca de 68% do valor do grão de milho. Moreira et al. (2002)
observaram ED e EM, para suínos em crescimento e terminação, de 3060 kcal/kg e
2949 kcal/kg, respectivamente.
Soares et al. (2004),
utilizando suínos nas fases de crescimento e terminação, verificaram que a
inclusão de germe em até 30% não afetou o desempenho e características de
carcaça. Segundo Moreira et al. (2002) se o preço do germe for 80% do
preço do milho, o nível de 15% de inclusão será o mais econômico, tanto para a
fase de crescimento quanto para a fase de terminação.
11. Farinha
de Bolacha
A farinha de bolacha
é um subproduto da indústria alimentícia humana. Seu uso tornou-se possível
devido ao seu valor energético e sua palatabilidade. Santos et al.
(2005) analisaram uma farinha de bolacha que continha 89% de MS, 8,2% de PB e
4350 kcal/kg de EB. Em um ensaio de metabolismo, Barbosa et al. (1999),
usando suínos machos castrados, determinaram 3363 e 3315 kcal/kg de ED e EM
para o resíduo de Bolacha Maisena, mostrando-se desta forma um potencial
substituto do milho.
12.
Considerações Finais
Sempre que houver a
possibilidade de uso de um alimento alternativo, em função de disponibilidade,
baixo custo, facilidade de transporte, é necessário conhecer seu valor
nutricional e a presença de fatores anti-nutricionais. Sempre que houver
processamento de algum sub-produto, envolvendo temperatura, pressão e tempo de
atuação dos dois primeiros fatores, deve-se pensar em variabilidade na
composição nutricional do ingrediente. Neste caso, análises tanto
bromatológicas, e in vivo (ensaios de digestibilidade) devem ser
exigidas. A padronização de processos, portanto, é uma meta a ser buscada e a
fidelização entre fornecedor da matéria prima e produtor pode vir a ser um
fator decisivo para a melhoria continua dos processos. A forma como o
ingrediente se encontra também é outro fator decisivo na utilização de
ingredientes alternativos. Alta umidade e alta gordura são fatores que levam
facilmente à deterioração dos ingredientes e nos respectivos casos
secagem extra e uso de anti-oxidantes precisam entrar no cálculo do custo
de utilização.
Concluindo,
alternativas ao milho e à soja há. Mas a decisão de usá-los depende de inúmeros
fatores difíceis de serem incluídos numa equação simplificada.